Atualmente, mesmo que de modo recente, a surdez tem sido defendida por muitos ativistas e intelectuais como uma condição cultural, e não médica e biológica. Assim, falar de surdos, e não “deficientes auditivos“, significa hoje dar enfoque à surdez como um motivo de orgulho, uma identidade cultural, e não uma deficiência. A seguir, entenda mais sobre essa cultura surda.
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Cultura e identidade surda
A cultura surda é o conjunto de características que tornam uma pessoa parte da comunidade surda ou do povo surdo, permitida principalmente pelo uso da língua de sinais.
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Logo, a cultura surda é colocada em oposição à cultura ouvinte, ou seja, o modo de ser e de se comunicar que é característico das pessoas que ouvem.
Nesse contexto, a cultura possui um sentido próximo à identidade surda. Para ilustrar, é possível fazer um paralelo com outros grupos sociais: por exemplo, a população negra. Em vários países, os movimentos negros levantam a identidade negra, valorizando as culturas africanas e denunciando o racismo e a desigualdade social.
Semelhantemente, a cultura surda é uma forma de se orgulhar do modo de ser surdo e unir pessoas politicamente. Portanto, falar de cultura e identidade é rejeitar a noção de que a surdez é uma falha ou algo a ser consertado por médicos.
O que caracteriza a cultura surda?
Quando falamos em “cultura” nesse sentido próximo ao de “identidade”, devemos ter em mente que esses termos servem principalmente aos objetivos políticos de união de indivíduos. Ou seja, não devem ser tomadas literalmente – afinal, as pessoas nunca são completamente iguais, nem totalmente diferentes.
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O que faz parte da cultura surda, portanto, trata-se de algumas generalizações. Geralmente são considerados como elementos componentes da cultura surda: uso da Libras; sensibilidade visual e às vibrações; visão aguçada; e uso de tecnologias como campainha de luz.
Além disso, é possível que outras características possíveis de pessoas surdas sejam citadas: sinceridade; não medem as palavras; desconfiança; prazer em conversar; entre outros. Esses elementos sublinham que existe uma riqueza social entre os surdos, e que o fato de não verbalizarem não é um demérito.
Assim, dentro da cultura surda há literatura, poesia, teatro, história, e outros componentes que valorizam a língua de sinais e o modo de vida de pessoas surdas. Essas produções culturais e artísticas visam também mostrar politicamente a legitimidade dessa identidade.
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Tipos de cultura surda e suas identidades
Como foi exposto acima, não é possível homogeneizar e generalizar as experiências de pessoas surdas. Nesse sentido, a pesquisadora Gládis Perlin classificou tipos de culturas e identidades surdas conforme o uso da língua de sinais e a inserção no mundo ouvinte. Confira:
- Identidades surdas: são geralmente filhos surdos de pais também surdos, no qual a realidade visual (em contraposição à auditiva) não é algo estranho e nem perturbador ao indivíduo. Essa identidade ainda está ligada à militância e a defesa política de sua cultura.
- Identidades surdas híbridas: diz respeito às pessoas surdas que nasceram com a capacidade auditiva, mas, por alguma razão, encontraram-se com a surdez depois. Nesse caso, há uma identificação próxima com a identidade surda.
- Identidades surdas de transição: são filhos surdos de pais ouvintes e, por isso, tiveram a experiência de terem de se adaptar à força ao mundo ouvinte. Assim, são pessoas que possuem uma passagem ao mundo surdo tardiamente e precisam reconstruir suas percepções.
- Identidade surda incompleta: desse grupo fazem parte aqueles que trabalham contra as próprias culturas surdas, propagando a ideologia ouvinte. Nessa acepção, essas pessoas acreditam que os surdos devem abandonar a língua de sinais para oralizar.
- Identidades surdas flutuantes: são os surdos que, pode-se dizer, “colonizados” pela cultura ouvinte. Ou seja, são as pessoas que querem oralizar e se integrar a qualquer custo ao mundo ouvinte, desprezando a comunidade e a cultura surdas.
Valorização da cultura surda
Em outubro de 2009, na novela Cama de Gato, havia um personagem surdo que fazia uso da Libras para se comunicar. No entanto, um grupo de médicos otorrinolaringologistas publicou uma nota, repudiando a cena.
Conforme os médicos, o uso da Libras significava um atraso, pois havia um avanço nas cirurgias de implante coclear que fazem pessoas surdas terem a possibilidade de ouvir. Na visão desses profissionais, a surdez era algo a ser corrigido, e a Libras era retrógrada.
A essa altura, já é possível notar que a cultura e a identidade surdas visam justamente combater esse tipo de posicionamento. Afinal, ser surdo não é um defeito, mas um modo de vida legítimo, com uma língua própria que já é reconhecida cientificamente e pela lei.
Contra esse posicionamento dos médicos, houveram grupos que defenderam o uso da Libras e o orgulho da cultura surda. Nesse contexto, é importante pontuar que fazer o implante coclear é uma decisão individual, e ela não deve significar diminuir a língua de sinais e a surdez.
Vídeos para se aprofundar sobre a surdez e sua cultura
Para entender mais sobre a cultura surda, é importante ter o contato com outras pessoas que entendem do tema falando do assunto. Assim, veja abaixo uma série de vídeos que, inclusive, proporcionarão um contato com a língua de sinais:
Cultura surda x Cultura ouvinte
No vídeo acima, confira um psicólogo ouvinte que é bilíngue – ou seja, fala em português e em Libras – explicando sobre as diferenças entre a cultura surda e a ouvinte. Com ele, será possível entender mais sobre os sentidos dessa distinção.
A história da surdez
Um dos grandes aspectos levantados pelo movimento surdo na defesa de sua cultura é sobre a história de sua comunidade ou povo. Você sabia, por exemplo, que existe uma universidade feita por surdos? Saiba mais sobre a trajetória política da surdez.
Relação entre surdo e ouvinte
Existem várias relações possíveis entre surdos e ouvintes. A diferença entre ambos, afinal, é cultural conforme a perspectiva da identidade surda. Entenda, no vídeo acima, sobre como é a relação amorosa entre um casal audiologicamente discordante.
Orgulho surdo
Uma das posturas principais que os movimentos identitários atuais demonstram é o orgulho pela sua comunidade, e com os surdos não é diferente. Veja mais sobre como a surdez e a sua cultura podem ser levantadas como um modo de vida legítimo.
Assim, a cultura surda é um modo de mostrar como o preconceito contra as pessoas surdas é um etnocentrismo, pois trata-se de uma intolerância a um grupo cultural diferente do seu. Para quem se interessa pelo tema, vale a pena entender também sobre a língua de sinais e sua importância.
Referências
Entre a deficiência e a cultura: análise etnográfica de atividades missionárias com surdos – César Augusto de Assis Silva;
Identidades surdas no processo de identificação linguística: o entremeio de duas línguas – André Luís Batista Martins.
Por Mateus Oka
Mestre em Antropologia Social pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Cientista social pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Realiza pesquisas na área da antropologia da ciência.
Oka, Mateus. Cultura surda. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/sociologia/cultura-surda. Acesso em: 27 de November de 2024.
1. [FUNDATEC]
Conforme Strobel (2008), cultura surda é o jeito de o sujeito surdo entender o mundo e de modifica-lo a fim de torna-lo acessível e habitável, ajustando-o com suas percepções visuais, que contribuem para a definição de identidades surdas e das almas das comunidades surdas. Isso significa que ela abrange:
a) A escola, a família, os amigos, os costumes do povo surdo
b) Os amigos, a cultura, as festas e as viagens do povo surdo
c) A língua, as ideias, as crenças, os costumes e os hábitos do povo surdo
d) A escola, a família, os amigos os costumes linguísticos e sociais do povo surdo
e) A família, as ideias, as crenças, os costumes e os hábitos do povo surdo
Resposta: c
Justificativa: os amigos e a cultura muitas vezes são ouvintes; assim elas não fazem parte da cultrua surda.
2. [FUNDATEC]
O processo de transmissão cultural dos sujeitos surdos se dá através de experiências:
a) Familiares, visuais, com especialistas, médicos e fonoaudiólogos
b) Em contato com a comunidade ouvinte a fim de possibilitar conhecimento efetivo
c) Visuais, artísticas, sociais, contando com o auxílio de médicos e fonoaudiólogos
d) Visuais, em escolas de surdos, em contato com a comunidade surda
e) Visuais, artísticas, clínicas e em escolas inclusivas
Resposta: d
Justificativa: a cultura surda se expressa e se reproduz em locais onde a comunidade surda se fortalece