Provavelmente você já ouviu falar em concretismo e movimentos de vanguarda, principalmente porque a poesia contemporânea se preocupa bastante com a mistura entre linguagem, imagem e símbolo para criar sentidos. Mergulhe em uma parte da história da Literatura e entenda o que é poema visual, analisando alguns tipos dentro de uma parte da história da poesia.
Publicidade
O que é poema visual
De modo mais direto, o poema visual é aquele que conjuga a poesia e outras artes imagéticas e sonoras, como as artes visuais, a música, a dança etc. O conceito de poesia, no poema visual, é mais amplo e não se restringe ao uso exclusivo da linguagem verbal.
O poema visual explora outras dimensões que a confluência, ou seja, a união entre as linguagens verbal e visual podem permitir. Pode-se dizer que a poesia visual cria uma ruptura com os moldes tradicionais da poesia escrita, haja vista que não define a arte poética pelos limites do verso.
É exatamente por considerar o imagético como principal veículo para transmitir a mensagem que a poesia visual nem sempre considera a palavra como o núcleo da obra, mas sim o símbolo. Daí a importância dos arranjos e da organização espacial do poema, pois é isso que caracteriza o poema visual.
Relacionadas
História do poema visual
Embora pareça algo novo, os poemas visuais já foram registrados na Antiguidade. Em 325a.C., Símias de Rodes criou o poema intitulado ‘O ovo’, sendo esse o poema visual mais antigo que se tem registro, pelo menos na cultura ocidental. A ideia do poema é mostrar o nascimento do canto, da poesia. A fêmea protege o ovo, mas sabe que após chocar é preciso alçar voo, assim como Hermes que jogou a poesia aos mortais para criarem o canto.
Mallarmé (1842-1898), um importante poeta e crítico literário francês, trabalhou o poema visual no seu famoso poema ‘Un coup de dés jamais n’abolira le hasard‘ (‘Um lance de dados jamais abolirá o acaso’), em que desconsidera as linhas que compunham o verso, denominando-as de ‘subdivisões prismáticas’. Assim, por meio dos espaços em branco deixados no texto, o autor conseguia informar o ritmo do poema, evidenciando as pausas. Depois de Mallarmé, muitos outros autores começaram a desenvolver poesia visual, influenciados pelos movimentos de vanguarda do século XX.
Publicidade
Poema visual no Brasil
Sem dúvidas, o Concretismo foi a maior expressão de poesia visual no Brasil. O movimento, liderado por Décio Pignatari e os irmãos Augusto e Haroldo de Campos, explorou as possibilidades visuais da poesia no seu limite.
Outro grande nome foi Ferreira Gullar, poeta que buscou os limites da linguagem poética não só na poesia visual, mas também no interior da própria crise da linguagem que surgiu no século XX. Paulo Leminski representou uma grande diversidade literária, conhecido também por popularizar o haikai na literatura brasileira.
Tipos de poema visual
Como a poesia visual ativa várias outras artes visuais e musicais, tendo como base a imagem, existem alguns tipos de poemas visuais, cada uma com sua especificidade. A seguir, veja os tipos de poemas visuais e seus principais autores:
Publicidade
Caligrama
O caligrama é uma forma de poema visual que dispõe as palavras de modo a formarem um objeto imagético que representam um símbolo. Em um dos poemas mais famosos de Apollinaire, é possível perceber que as palavras formam uma mulher. Outra particularidade do caligrama é que só é permitido usar recursos do mundo da escrita, ou seja, outros traços não são considerados caligramas. O primeiro exemplo, do poema ‘O ovo’, pode ser considerado um caligrama. Confira os principais representantes do caligrama:
- Guillaume Apollinaire (1880-1918): provavelmente o primeiro poeta a reutilizar essa forma, foi ele que primeiro usou a palavra caligrama. Também foi um dos ativistas de vanguarda mais importantes, defendendo o Cubismo e sendo o inventor do termo Surrealismo;
- José Juan Tablada (1871-1945): foi um poeta, jornalista e diplomata mexicano. Seu nome está associado aos movimentos modernistas de língua espanhola, sendo o primeiro modernista mexicano;
- Oliverio Girondo (1891-1967): foi um poeta argentino do movimento de vanguarda;
- Guillermo Cabrera Infante (1929-2005): foi um escritor cubano, produziu não só poemas visuais, mas também romances, contos, ensaios e roteiros para cinema.
Poesia experimental portuguesa (PO-EX)
O movimento PO-EX foi criado por poetas portugueses inspirados pelos ares do concretismo e da poesia visual do século XX. O movimento foi lançado a partir da revista Poesia Experimental, publicada em 1964 e contou com os seguintes autores:
- E. M. de Melo e Castro (1932-2020): poeta português que explorou diversos meios e mídias;
- M. S. Lourenço (1936- 2009): além dos poemas, foi importante para a parte teórica da PO-EX;
- Ana Hatherly (1929-2015): além de escritora e pintura, Hatherly foi importante por questionar a ideia concretista de que a poesia visual teria sido inventada no século XX. Segundo ela, era preciso incluir no conceito todas as experiências de textos-imagens (hieróglifos, ideogramas, criptogramas, diagramas etc.).
Concretismo
O movimento a utilizar a poesia visual de modo mais difundido foi o concretismo. Os poemas concretistas, em geral, tinham uma crítica política forte, sobretudo os primeiros autores, na década de 50. Embora o concretismo tenha sido um movimento internacional, a poesia concreta foi, de fato, definida e aplicada pelos irmãos Campos e Décio Pignatari, que escreveram o Manifesto ‘Plano-piloto para poesia concreta’, publicado em São Paulo, em 1958. Além desses três poetas, conheça alguns outros:
- José Paulo Paes (1926-1998): ainda que tenha participado do concretismo, o estilo de Paes era mais voltado à poética de Oswald de Andrade;
- José Lino Fabião Grünewald (1931-2000): poeta, tradutor, crítico de cinema, de música popular brasileira e de literatura, Grünewald fez parte do grupo de poetas concretos Noigandres;
- Arnaldo Augusto Nora Antunes Filho (1960-): Arnaldo Antunes é um músico, poeta e artista visual brasileiro. Além de escrever diversos poemas concretos, é conhecido por ter feito parte das bandas Titãs e Tribalistas.
Outros tipos de poemas visuais
A poesia visual é muito ampla, haja vista que pode ser considerada tudo aquilo que relaciona linguagem escrita com imagem. Por isso, existem muitos outros tipos de poemas visuais. Vale a pena citar:
- Poema objeto: um dos maiores poetas a explorar esse gênero foi Ferreira Gullar. O poema objeto utiliza não só a linguagem, mas uma estrutura, em que a interação com o leitor-espectador é imprescindível;
- Infopoesia: é a poesia que utiliza a imagem, mas que é feita exclusivamente por um meio digital, como o computador, celular ou tablet. Um poeta que se aventurou nesse tipo foi Wlademir Dias-Pino;
- Carmina figurata: foi um tipo de poema visual que foi criando no Baixo Império Romano, por volta de 350 e existe até hoje. O poema era composto por uma imagem de cruz e textos que perpassavam a imagem, com temas religiosos. Rabanus Maurus foi um escritor que produzir diversos poemas de carmina figurata.
Como se vê, a história e os tipos de poemas visuais são vastos. Na verdade, não poderia ser diferente, considerando que a própria escrita surgiu de imagens. Desse modo, é natural que exista essa convergência.
Por (dentro)ㅤ d o sㅤ e s p a ç o sㅤ da poesia visual
Para fixar seus conhecimentos, nada melhor do que assistir videoaulas sobre o assunto. Nesses três vídeos você poderá conhecer um pouco melhor o universo da poesia visual. Confira:
Panorama sobre o Concretismo
Neste vídeo, você vai aprender um pouco mais sobre o Concretismo, um dos tipos mais famosos da poesia visual. O professor explica de forma didática o início, características, autores e exemplos de poemas para visualizar todos os elementos citados. Assista com atenção e anote as principais informações.
Haroldo de Campos sobre a tradição do verso
Como você viu, Haroldo de Campos é um dos principais poetas representantes do Concretismo. Neste vídeo, você poderá entender a visão do poeta sobre a poética de Mallarmé, no poema ‘um lance de dados’, que foi uma grande influência para os concretistas brasileiros. Embora o vídeo seja curto, Haroldo basicamente explica como que a poesia se tornou pós-moderna com o rompimento da métrica do verso.
Poema de Arnaldo Antunes
Muito provavelmente você conhece o Arnaldo Antunes por causa da banda Titãs, não é mesmo? Assim como na música, Arnaldo também cria diversos sentidos utilizando a palavra, imagem e significado. Esse poema visual relaciona as classes gramaticais com as respectivas palavras que passam no vídeo. A obra é uma verdadeira decomposição semântica e gramatical.
Gostou dessa matéria? Veja outro movimento que mudou a concepção de poesia brasileira, o Modernismo no Brasil.
Referências
Teoria da Poesia Concreta (1965) – Décio Pignatari, Augusto de Campos e Haroldo de Campos
INFOPOESIA: Uma poesia transpoética (1997) – E. M. de Melo e Castro
Modernidade e vanguarda em Mallarmé (2017) – Andressa Cristina de Oliveira e Thais de Souza Almeida
Cisne isolado, sujeito deslocado: Mallarmé em diálogo com Apolo, Baudelaire, Andersen e Eduardo Guimaraens (2014) – Bruno Anselmi Matangrano
Por Marilia Duka
Graduada em Filosofia pela Universidade Estadual de Maringá em 2016. Graduada em Letras Português/Francês na Universidade Estadual de Maringá em 2022.
Duka, Marilia. Poesia visual. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/literatura/poesia-visual. Acesso em: 21 de November de 2024.
1.
Sobre o poema concreto de Augusto de Campos, estão corretas as proposições:
I. Em Miragem que em mim mira temos um exemplo de catacrese.
II. A oração eu tento tântalo pode ser compreendida como a forma coloquial eu tento tanto. É possível perceber que o poeta faz uma brincadeira com o nome da personagem mitológica por meio de uma paronomásia.
III. No poema é possível perceber a preocupação com o efeito ótico, recurso comum na poesia concreta.
IV. No poema de Augusto de Campos não há preocupação em romper com a estrutura discursiva do verso tradicional.
a) II e III estão corretas.
b) I e IV estão corretas.
c) II, III e IV estão corretas.
d) Todas estão corretas.
Alternativa A está correta. Augusto de Campos, como poeta concretista, tinha preocupação com romper as estruturas tradicionais e, por isso, a preocupação com as figuras de linguagem e com a disposição visual do poema.
2. [UFRGS]
Considere as seguintes afirmações sobre o Concretismo.
I. Buscou na visualidade um dos suportes para atingir rupturas radicais com a ordem discursiva da língua portuguesa.
II. Teve como integrantes fundamentais Haroldo de Campos, Augusto de Campos e Décio Pignatari.
III. Foi um projeto de renovação formal e estética da poesia brasileira, cuja importância fica restrita à década de 1950.
Quais estão corretas?
a) Apenas I.
b) Apenas II.
c) Apenas III.
d)Apenas I e II.
e) I, II e III.
Alternativa D está correta. O Concretismo surgiu na década de 1950 e perdura até os dias de hoje, influenciando grupos de poetas, músicos e artistas plásticos. Sendo Arnaldo Antunes um dos exemplos da atualidade.