O Cortiço

O Cortiço é uma obra escrita com o objetivo de interpretar o Brasil. O autor descreve como o ambiente precário e urbano desenvolvia o pior lado das pessoas.

No século XIX, surgia na Europa um movimento chamado naturalismo e O Cortiço foi a grande obra que representou essas ideias no Brasil. O naturalismo, dentre diversos aspectos, pretendia descrever a realidade em uma linguagem “nua e crua”. Assim, o objetivo era ressaltar os aspectos negativos da humanidade e mostrar o quão ruim as pessoas poderiam ser.

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O Cortiço, de autoria de Aluísio Azevedo, foi publicado em 1890. Assim como os naturalistas europeus, o autor pensava que o meio em que os indivíduos vivem possui um efeito determinista sobre seus comportamentos. Consequentemente, o cortiço retratado na história influenciava e explicava a razão de as pessoas serem aquilo que eram.

Personagens

  • João Romão: é o dono do cortiço, que é um amontoado de casas pequenas alugadas para pessoas pobres. João Romão é a personificação do capitalista que tenta enriquecer a todo custo, mas não desfruta nada daquilo que acumula.
  • Miranda: é um português, assim como João Romão. O Miranda, ao contrário, desfruta de todo o dinheiro que consegue possuir; entretanto, sua fonte de renda vem de sua esposa, que o trai constantemente.
  • Pombinha: é uma moça de 17 anos que nunca menstruou. Sendo a única pessoa do cortiço que sabia ler, era querida por todos. Na história, ela perde sua virgindade com uma mulher.
  • Jerônimo: é a personificação de um trabalhador firme e honesto. Entretanto, ao longo da história, o personagem acaba se deixando levar pelo seu ambiente e abandona tais qualidades.
  • Rita Baiana: é uma mulher sedutora que alegra todo o cortiço quando ela está nas festas. Ela e Jerônimo acabam se apaixonando e fugindo do lugar.
  • Zulmirinha: é filha do Miranda e odiada por ele, que acha que ela não é sua filha legítima. Ela é entregue para se casar com João Romão.
  • Bertoleza: é uma escrava fugida que João Romão libertou com uma carta de alforria falsificada. Com ela, João mantém uma relação até que ela se torna um empecilho para sua ascensão social.

Resumo da obra

João Romão é um português que veio ao Brasil em busca de melhores condições de vida. No entanto, ele acaba trabalhando para um outro português que o explora, atrasando muitos pagamentos. Por fim, o chefe de João Romão decide voltar para Portugal e ele deixa uma venda, que era de sua propriedade, como forma de quitar os pagamentos.

Junto com uma escrava, Bertoleza, João Romão faz seu negócio: por meio de truques sujos e enganando clientes, ele consegue juntar dinheiro e comprar pequenas casas. Ele então aluga essas moradias precárias para pessoas pobres a baixo custo, formando então o cortiço.

Esse cortiço acaba sendo personificado na narrativa, como se fosse um grande organismo. Por exemplo, quando amanhece, o cortiço “acorda”, suas portas se abrem e as pessoas que lá vivem podem ser lidas como meros coadjuvantes.

O cortiço é então um palco das mais diversas tramas entre os personagens da obra. Por exemplo, há o romance proibido entre Jerônimo e Rita Baiana, e os conflitos de Pombinha que, mesmo com 17 anos, ainda não havia menstruado. As situações são descritas de um modo cru, animalesco e por vezes cômico.

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Desfecho

João Romão vê o seu vizinho, Miranda, como um rival. Afinal, Miranda é um português com dinheiro e desfruta de sua riqueza. Em um dado momento, ele consegue o título de barão, ascendendo socialmente. Enquanto isso, João apenas acumulava dinheiro, sem experimentar um maior prestígio social.

Por fim, João Romão consegue pedir a mão da filha de Miranda, Zulmirinha, em casamento. Aliando-se à essa família, ele conseguiria ascender socialmente. Entretanto, agora a Bertoleza, sua amante e escrava, tornou-se um empecilho. João então faz de tudo para tentar se livrar dela.

No final das tentativas, João Romão denuncia Bertoleza para a polícia por ser uma escrava fugida. Quando ela está prestes a ser capturada, no desespero das condições, ela acaba se suicidando. João Romão, sem escrúpulos, se aproveita da situação para experimentar sua ascensão social.

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Análise da obra e contexto histórico

  • Narrador: terceira pessoa;
  • Espaço: Rio de Janeiro;
  • Tempo: final do século XIX;
  • Foco narrativo: a vida no cortiço;
  • Fatores externos: fim da escravidão, instauração da República e crescimento urbano.

O contexto histórico que a obra é publicada é da emergência da Primeira República e a necessidade de fazer do Brasil uma nação. Aluísio Azevedo é influenciado pelo movimento naturalista europeu e tenta retratar a realidade brasileira em sua forma “crua”. Para o autor, o meio que envolve os indivíduos é a força natural que molda os comportamentos de cada um.

O português é retratado como o estrangeiro que explora os recursos nacionais. Os comportamentos de João Romão, como um ambicioso que quer a todo custo o sucesso econômico, é tratado como um padrão típico português. Apesar disso, há o português que se deixa vencer pela força do meio: Jerônimo, trabalhador português, adota comportamentos “abrasileirados” ao deixar a família e fugir com a amante.

Frequentemente, o autor descreve as pessoas como um aglomerado de machos e fêmeas que visam procriar. Esse aspecto fica bastante explícito quando são feitas comparações entre os comportamentos de seres humanos e de animais.

Assim, o autor está entre uma série de contradições: o nacional e o estrangeiro, os instintos e o meio. Tudo isso faz parte de uma tentativa de compreender o Brasil, como uma nação que tenta se construir depois de anos de exploração e escravidão tardia.

Portanto, em muitos aspectos o cortiço seria um protótipo do próprio Brasil. Nesse sentido, o objetivo do autor era retratar a realidade em si, como uma pesquisa científica mostra as leis gerais da natureza.

Entenda mais sobre a obra

A história de O Cortiço é extensa e possui muitos detalhes e personagens. Por essa razão, materiais audiovisuais podem ajudar a compreender melhor a obra. Confira abaixo uma seleção de vídeos didáticos que vão encaminhar o seu estudo:

Uma visão geral da obra

O Cortiço é uma obra importante na literatura brasileira, sobretudo quando se trata do movimento naturalista. Neste vídeo, as principais características desse tipo literário e um resumo da história e dos personagens estão disponíveis.

Resumo da história

No vídeo, a história do livro é resumida principalmente a partir das tramas vividas por João Romão. Além disso, é importante dar atenção às características naturalistas do enredo e de como o autor tenta provar o seu ponto de vista por meio de sua obra.

O autor e a obra

Conheça mais a respeito do autor, Aluísio Azevedo, e como sua obra mais popular, O Cortiço, foi reconhecida. Entender as influências desta figura é essencial para compreender também a história por trás do livro.

Uma vez que essa obra é cheia de detalhes e personagens, ter o contato com o livro e ler o texto é a melhor maneira de aprofundar seu conhecimento. Mais do que pensar em um enredo linear e com um sentido único, O Cortiço é importante por ter uma narrativa que quer descrever a realidade brasileira.

Sobre o autor

Aluísio de Azevedo
Aluísio de Azevedo

Aluísio Tancredo Gonçalves de Azevedo nasceu em 1857, na cidade de São Luís, no Maranhão. Desde cedo interessado pela atividade artística, estudou na Imperial Academia de Belas Artes. No entanto, com a morte de seu pai, teve de voltar para sua cidade natal para ajudar a família.

A primeira vez que conseguiu reconhecimento como escritor foi em 1881, com a publicação de O mulato. Nessa obra, ele tratava sobre o preconceito racial e foi bem apreciado pela Corte. Assim, ele pôde retornar ao Rio de Janeiro e investir em sua carreira de escritor.

Ao longo de sua vida, trabalhou publicando em jornais e escrevendo romances, crônicas e peças de teatro. Em 1890 foi lançada uma de suas obras mais conhecidas, O cortiço. Ele só interrompeu sua carreira de escritor em 1895, quando começou a trabalhar como diplomata.

Aluísio Azevedo morreu em Buenos Aires, na Argentina, em 1913, por conta de seu emprego. Faleceu com apenas 56 anos de idade e seu corpo foi levado para São Luís em 1919.

Filme e outras adaptações

Sendo uma obra bastante conhecida, algumas adaptações do texto foram feitas para outros campos. Confira abaixo uma lista com algumas dessas produções que podem oferecer uma experiência diferente da história original:

O Cortiço (1945)

Foi a primeira adaptação cinematográfica da obra de Aluísio Azevedo, dirigido por Luiz de Barros e estreou em 1945. Essa versão pode ser difícil de ser encontrada. No filme regravado em 1978, há uma menção ao diretor como um pioneiro do cinema brasileiro.

O Cortiço (1978)

Em 1978, a primeira versão da adaptação do livro foi regravada e dirigida por Francisco Ramalho Jr. As críticas ao filme são diversas, e pode ser interessante assisti-lo e comparar com a obra original.

O Cortiço em Quadrinhos

Parte de O Cortiço em história em quadrinhos.
Parte de O Cortiço em história em quadrinhos. Disponível em: https://rodrigorosa.com

Em 2009 foi publicada essa adaptação da obra de Aluísio Azevedo. O texto é de autoria de Ivan Jaf com ilustração de Rodrigo Rosa. Essa obra retrata, assim como na história original, o cotidiano dos moradores do cortiço.

10 frases de O Cortiço para sentir o tom da obra

Algumas frases selecionadas do livro podem ajudar a entender algumas de suas características, principalmente sobre as metáforas animalescas e sua visão sobre o Brasil. Confira abaixo essas citações:

  • “E, para individualizar o objeto do seu ódio, voltava-se contra o Brasil, essa terra que, na sua opinião, só tinha uma serventia: enriquecer os portugueses, e que, no entanto, o deixara, a ele, na penúria.”
  • “[…] dissera que o Brasil era uma cavalgadura carregada de dinheiro, cujas rédeas um homem fino empolgava facilmente”

    “Prezava, acima de tudo, a sua posição social e tremia só com a ideia de ver-se novamente pobre, sem recursos e sem coragem para recomeçar a vida, depois de se haver habituado a umas tantas regalias e afeito à hombridade de português rico que já não tem pátria na Europa.”

    “Agora, encarando as lágrimas do Bruno, ela compreendeu e avaliou a fraqueza dos homens, a fragilidade desses animais fortes, de músculos valentes, de patas esmagadoras, mas que se deixavam encabrestar e conduzir humildes pela soberana e delicada mão da fêmea.”

    “E viu o Firmo e o Jerônimo atrassalharem-se, como dois cães que disputam uma cadela da rua; e viu o Miranda, li defronte, subalterno ao lado da esposa infiel, que se divertia a fazê-lo dançar a seus pés seguro pelos chifres”

    “Não era a inteligência nem a razão o que lhe apontava o perigo, mas o instinto, o fato sutil e desconfiado de toda a fêmea pelas outras, quando sente o seu ninho exposto.”

    “Já não eram dois instrumentos que soavam, eram lúbricos gemidos e suspiros soltos em torrente, a correrem serpenteando, como cobras numa floresta incendiada”

    “Era um português de seus trinca e cinco a quarenta anos […]: pescoço de touro e cara de Hércules, na qual os olhos todavia, humildes como os de um boi de canga, exprimiam tranquila bondade.”

    “Mas, ninguém como a Rita; só ela, só aquele demônio, tinha o mágico segredo daqueles movimentos de cobra amaldiçoada”

    “Quem me comeu a carne tem de roer-me os ossos!”

    Definitivamente, essa obra de Aluísio Azevedo é considerada um clássico. Ela continua em discussão por aparecer frequentemente em vestibulares e provas de literatura. Em todos os casos, sua importância na história literária brasileira é de reconhecimento geral.

    Referências

    O Cortiço: um estudo dos personagens à luz da Sociologia do Romance – Vivian C. Alves de Carvalho;

    De cortiço a cortiço – Antônio Candido;

    Aluísio Azevedo – Academia Brasileira de Letras;

    O Cortiço – Aluísio Azevedo.

    Mateus Oka
    Por Mateus Oka

    Mestre em Antropologia Social pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Cientista social pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Realiza pesquisas na área da antropologia da ciência.

    Como referenciar este conteúdo

    Oka, Mateus. O Cortiço. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/literatura/o-cortico. Acesso em: 22 de November de 2024.

    Exercícios resolvidos

    1. [ITA]

    Leia as proposições acerca de O Cortiço.
    I. Constantemente, as personagens sofrem zoomorfização, isto é, a animalização do comportamento humano, respeitando os preceitos da literatura naturalista.
    II. A visão patológica do comportamento sexual é trabalhada por meio do rebaixamento das relações, do adultério, do lesbianismo, da prostituição etc.
    III. O meio adquire enorme importância no enredo, uma vez que determina o comportamento de todas as personagens, anulando o livre-arbítrio.
    IV. O estilo de Aluísio Azevedo, dentro de O Cortiço, confirma o que se percebe também no conjunto de sua obra: o talento para retratar agrupamentos humanos.
    Está(ão) correta(s)
    a) todas.
    b) apenas I.
    c) apenas I e II.
    d) apenas I, II e III.
    e) apenas III e IV.

    Resposta: a

    Justificativa: a obra de Aluísio Azevedo faz parte do naturalismo brasileiro, o que significa que eram constantes as metáforas dos comportamentos humanos com o de animais, a explicitação de atividades sexuais, a precariedade do cenário urbano e aglomerado e, por fim, o determinismo do ambiente no comportamento das pessoas. Criados em um ambiente precário, as pessoas acabam adotando atitudes também antiéticas e negativas umas com as outras.

    2. [UFV-MG]

    Leia o texto abaixo, retirado de O Cortiço, e faça o que se pede:
    Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas. Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada, sete horas de chumbo.
    […].
    O rumor crescia, condensando-se; o zunzum de todos os dias acentuava-se; já se não destacavam vozes dispersas, mas um só ruído compacto que enchia todo o cortiço. Começavam a fazer compras na venda; ensarilhavam-se discussões e rezingas; ouviam-se gargalhadas e pragas; já se não falava, gritava-se. Sentia-se naquela fermentação sangüínea, naquela gula viçosa de plantas rasteiras que mergulham os pés vigorosos na lama preta e nutriente da vida, o prazer animal de existir, a triunfante satisfação de respirar sobre a terra.
    AZEVEDO, Aluísio. O cortiço. 15. ed. São Paulo: Ática, 1984. p. 28-29.
    Assinale a alternativa que NÃO corresponde a uma possível leitura do fragmento citado:
    a) No texto, o narrador enfatiza a força do coletivo. Todo o cortiço é apresentado como um personagem que, aos poucos, acorda como uma colmeia humana.
    b) O texto apresenta um dinamismo descritivo, ao enfatizar os elementos visuais, olfativos e auditivos.
    c) O discurso naturalista de Aluísio Azevedo enfatiza nos personagens de O Cortiço o aspecto animalesco, “rasteiro” do ser humano, mas também a sua vitalidade e energia naturais, oriundas do prazer de existir.
    d) Através da descrição do despertar do cortiço, o narrador apresenta os elementos introspectivos dos personagens, procurando criar correspondências entre o mundo físico e o metafísico.
    e) Observa-se, no discurso de Aluísio Azevedo, pela constante utilização de metáforas e sinestesias, uma preocupação em apresentar elementos descritivos que comprovem a sua tese determinista.

    Resposta: d

    Justificativa: na obra O Cortiço, não há uma consideração sobre a introspecção ou elementos subjetivistas de cada personagem. Ao contrário, o cortiço é um grande organismo e as pessoas são um aglomerado de indivíduos, crescendo em um ambiente precário e violento. Assim, as descrições do livro não são de ordem individual, mas coletiva.

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