Canção do Exílio

Poema clássico da literatura brasileira que expressa a saudade da terra natal, o ufanismo e a valorização da natureza.

Um dos poemas nacionais mais famosos tematiza a saudade de quem está longe do seu país. A cor local, expressa pelo cenário da natureza, constrói o Brasil como um lugar paradisíaco sobre o qual se sente nostalgia e desejo de retorno: “Não permita Deus que eu morra / Sem que eu volte para lá”. Conheça melhor o poema Canção do Exílio a seguir!

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O poema

Canção do Exílio foi escrito pelo brasileiro Gonçalves Dias em julho de 1843, quando ele estava estudando Direito em Coimbra (Portugal). É considerado um poema lírico sendo publicado na antologia “Primeiros cantos”, em 1846. Leia-o a seguir:

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Canção do Exílio
Minha terra tem palmeiras
Onde canta o sabiá;
As aves que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá.

Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar – sozinho, à noite –
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá.

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Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras
Onde canta o sabiá.

Um traço interessante do poema é que ele faz descrições sobre o Brasil em comparação com Portugal, mas em nenhum momento cita os nomes desses países. O que nos orienta geograficamente no poema são os advérbios “lá”, “cá” e “aqui” interpretados a partir da localização do autor.

Análise

Para compreender a Canção do Exílio é preciso saber o que a ideia de “exílio” representa, o contexto histórico em que o poema foi escrito e sua importância para a cultura brasileira. A seguir, leia sobre esses assuntos relevantes:

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O significado

Exílio corresponde a uma situação em que determinada pessoa está afastada do seu país de origem, onde ela gostaria de estar. O exílio pode ser forçado, quando alguém é obrigado a sair do país, ou por livre escolha, quando a pessoa decide ir para outro lugar por vontade própria, como Gonçalves Dias que foi a Portugal para estudar, logo, vivenciou um exílio físico e geográfico em relação ao Brasil.

Contexto histórico

A Canção do Exílio foi escrita no primeiro momento do Romantismo no Brasil, caracterizado pelo sentimento de nacionalismo em função da Independência (1822), logo, do rompimento político, econômico e social com Portugal. Assim, o poema de Gonçalves Dias expressa o patriotismo, a saudade e a valorização da terra natal do poeta, como também uma espécie de rejeição às características portuguesas expressas, de forma implícita, como inferiores às brasileiras.

Importância da obra

No momento da recente independência, o Brasil buscava construir a sua própria cultura, distanciando-se de Portugal e de suas referências. Assim, a literatura brasileira descreve o país e a identidade de seu povo de uma forma positivada, buscando suas particularidades como a palmeira e o sabiá, citados na Canção do Exílio. Inclusive, dois versos do poema apresentam trechos do Hino Nacional: “Nossos bosques têm mais vida, Nossa vida, (no teu seio) mais amores”.

Conforme você viu, o poema de Gonçalves Dias ilustra uma literatura de valorização do Brasil que colaborou para a formação do patriotismo.

Características

A Canção do Exílio carrega fortes traços do romantismo, principalmente em relação à subjetividade expressa por um eu-lírico que sente saudades de seu país e quer retornar para ele. Veja outras características a seguir:

  • Nacionalismo;
  • Simplicidade na linguagem;
  • Individualismo com a expressão de sentimentos particulares;
  • Musicalidade a partir da métrica e das rimas;
  • Ufanismo com a idealização do Brasil na descrição de sua natureza;
  • Redondilhas maiores, rimas perfeitas nos versos pares e ausência de rima nos demais versos.

Agora que você já conhece a Canção do Exílio e as suas características, leia um pouco sobre como esse texto deu origem a diversos outros.

A intertextualidade da Canção do Exílio

Por ser muito famosa na cultura brasileira, a Canção do Exílio foi e continua sendo retomada em textos dos mais diversos gêneros literários e textuais. A intertextualidade pode ser promovida pela paródia ou pela paráfrase e muitos textos inspirados na Canção do Exílio se tornaram tão famosos quanto ela. Como exemplos, a canção Sabiá, de Chico Buarque e Tom Jobim, e o poema A Nova Canção do Exílio, de Carlos Drummond de Andrade.

As paródias

A paródia usa a intertextualidade para criar outro texto baseado em um já famoso, pois é preciso que o interlocutor conheça o texto base para compreender tal paródia. Geralmente, ela apresenta um caráter crítico ou irônico e pode expressar sentidos muito diferentes do texto primário. Confira alguns exemplos a seguir:

Paródia de Oswald de Andrade

O poema Canto de Regresso à Pátria foi escrito pelo modernista Oswald de Andrade em 1924. Nessa paródia, Oswald não perde o tom nacionalista, mas usa o humor para se referir à cidade de São Paulo, símbolo do progresso do país, conforme você pode ler abaixo:

Canto de Regresso à Pátria
Minha terra tem palmares
Onde gorjeia o mar
Os passarinhos daqui
Não cantam como os de lá

Minha terra tem mais rosas
E quase que mais amores
Minha terra tem mais ouro
Minha terra tem mais terra

Ouro terra amor e rosas
Eu quero tudo de lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que eu volte para lá

Não permita Deus que eu morra
Sem que eu volte para São Paulo
Sem que veja a Rua 15
E o progresso de São Paulo
(Oswald de Andrade)

Paródia de Murilo Mendes

A Canção do Exílio de Murilo Mendes, escritor modernista, critica a cultura brasileira que valoriza tudo o que vem de fora e entrega o que tem de melhor para a exportação, tendo que pagar mais caro por isso depois, como ele expressa com as flores e frutas, veja:

Canção do Exílio
Minha terra tem macieiras da Califórnia
onde cantam gaturanos de Veneza.
Os poetas da minha terra
são pretos que vivem em torres de ametista,
os sargentos do exército são monistas, cubistas,
os filósofos são polacos vendendo a prestações.
A gente não pode dormir
com os oradores e os pernilongos.
Os sururus em família têm por testemunha a Gioconda
Eu morro sufocado
em terra estrangeira.
Nossas flores são mais bonitas
nossas frutas mais gostosas
mas custam cem mil réis a dúzia.
Ai quem me dera chupar uma carambola de verdade
e ouvir um sabiá com certidão de idade!
(Murilo Mendes)

Paródia de estudantes

A paródia abaixo foi escrita por dois estudantes da Zona Norte do Rio de Janeiro, retratando a violência na região, e fez muito sucesso nas redes sociais em 2017:

Minha terra tem horrores
Minha terra é a Penha,
o medo mora aqui.
Todo dia chega a notícia
que morreu mais um ali.

Nossas casas perfuradas
pelas balas que atingiu.
Corações cheios de medo
do polícia que surgiu.

Se cismar em sair à noite,
já não posso mais.
Pelo risco de morrer
e não voltar para os meus pais.

Minha terra tem horrores
que não encontro em outro lugar.
A falta de segurança é tão grande,
que mal posso relaxar.

‘Não permita Deus que eu morra’,
antes de sair deste lugar.
Me leve para um lugar tranquilo,
‘onde canta o sabiá’.

Assim como na Canção do Exílio de Gonçalves Dias, as paródias apresentadas também falam sobre o Brasil, mas carregam o caráter de crítica e de ironia expressando diferentes sentidos sobre o país.

Vídeos da canção do Brasil

Para aprofundar os seus conhecimentos sobre a Canção do Exílio e a cultura brasileira, assista aos vídeos abaixo que analisam o poema e o contexto em que ele foi criado:

O Romantismo de Gonçalves Dias

Revise as características das gerações românticas brasileiras com o professor Eurípedes. Aproveite e assista uma análise sobre a forma e o conteúdo do poema estudado!

O Brasil da Canção do Exílio

Nesse vídeo, a professora Juliana Jurisberg realiza uma análise completa da Canção do Exílio contemplando o eu-lírico, os temas, as características, a forma e o esquema de rimas do poema. Acompanhe!

Canção do Exílio: a identidade do Brasil

O professor Rafael Menezes discute como a Canção do Exílio apresenta traços de uma literatura que busca construir a identidade do Brasil, no momento pós-independência, recorrendo às características naturais do país. Confira!

A Canção do Exílio foi uma importante obra da primeira geração romântica brasileira. Agora, continue estudando o romantismo conhecendo a vida e a obra de José de Alencar.

Referências

As Canções do Exílio (2018) – Adriana Pereira Barbosa
Ainda uma vez, a “Canção do exílio” e cantos paralelos (2017) – Maria Augusta Fonseca

Érica Paiva Rosa
Por Érica Paiva Rosa

Professora, redatora e produtora cultural. Mestre em Letras pela UEM.

Como referenciar este conteúdo

Paiva Rosa, Érica. Canção do Exílio. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/literatura/cancao-do-exilio. Acesso em: 21 de November de 2024.

Exercícios resolvidos

1. [UFJF]

Quando escreveu a Canção do Exílio, em 1841, Gonçalves Dias estava em Portugal.

Assinale a alternativa inaceitável em relação ao texto:
(A) O pronome mais é empregado sempre para valorizar as coisas do Brasil, em relação às de Portugal.
(B) O eu-lírico sente-se como se estivesse exilado, com saudades da pátria.
(C) O advérbio refere-se ao Brasil.
(D) Os advérbios e aqui referem-se, respectivamente, ao Brasil e a Portugal.
(E) O poema é estruturado através de comparações entre o Brasil e Portugal.

Resposta: C
Justificativa: No poema, o advérbio “cá” refere-se a Portugal, local onde o poeta estava quando escreveu a Canção do exílio.

2. [ENEM]

TEXTO A
Canção do Exílio

Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
[…]
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar – sozinho, a noite –
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras
Onde canta o Sabiá.

DIAS, Gonçalves. Poesia e prosa completas. Rio de Janeiro: Aguilar, 1998.

TEXTO B
Canto de regresso à Pátria

Minha terra tem palmares
Onde gorjeia o mar
Os passarinhos daqui
Não cantam como os de lá
Minha terra tem mais rosas
E quase tem mais amores
Minha terra tem mais ouro
Minha terra tem mais terra
Ouro terra amor e rosas
Eu quero tudo de lá
Não permita
Deus que eu morra
Sem que volte para lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte pra São Paulo
Sem que eu veja a rua 15
E o progresso de São Paulo

ANDRADE, Oswald. Cadernos de poesia do aluno Oswald. São Paulo: Círculo do Livro. s/d.

Os textos A e B, escritos em contextos históricos e culturais diversos, enfocam o mesmo motivo poético: a paisagem brasileira entrevista a distância. Analisando-os, conclui-se que:

a) o ufanismo, atitude de quem se orgulha excessivamente do país em que nasceu, e o tom de que se revestem os dois textos.
b) a exaltação da natureza é a principal característica do texto B, que valoriza a paisagem tropical realçada no texto A.
c) o texto B aborda o tema da nação, como o texto A, mas sem perder a visão crítica da realidade brasileira.
d) o texto B, em oposição ao texto A, revela distanciamento geográfico do poeta em relação à pátria.
e) ambos os textos apresentam ironicamente a paisagem brasileira.

Resposta: C

Justificativa: A abordagem do tema é a mesma nos dois textos, entretanto, o segundo texto revisita o primeiro de forma crítica, que caracteriza a paródia, logo, estabelece a intertextualidade.

3. [UFJF]

TEXTO II
CANÇÃO DO EXÍLIO

Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá;
As aves que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá;
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar – sozinho –, à noite –
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras
Onde canta o sabiá.

DIAS, Antonio Gonçalves. Poesia completa e prosa
escolhida. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1959, p.103

TEXTO III

PAIVA, Miguel & SCHWARCZ, Lilia. Da colônia ao Império. Um Brasil para inglês ver….
São Paulo: Brasiliense, 1987, p. 11

Nos textos II e III, há um distanciamento da terra natal.

Assinale a alternativa que não corresponde aos textos:
(A) No texto III, há a referência à chegada do colonizador, à miscigenação do branco com o negro e à exploração da terra.
(B) No texto III, os elementos caracterizadores da terra natal se encontram na expressão linguística, nos trajes e no meio de transporte.
(C) As terras natais do personagem do texto III e do eu-lírico do texto II são diferentes.
(D) Nos textos II e III, há o reconhecimento de que a terra estrangeira é pródiga e prazerosa.
(E) A terceira estrofe do texto II e a última oração do texto III traduzem sentimentos distintos.

Resposta: D

Justificativa: No texto II, há o reconhecimento de que a terra estrangeira é pródiga e prazerosa. Por outro lado, o texto II não transmite isso, pois expressa que a terra natal é um lugar melhor do que a terra estrangeira onde o eu-lírico se encontra.

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