No início da década de 1960, o Brasil enfrentava uma profunda agitação política e ideológica, e um dos fatores que influenciou para tal cenário foi a tão conhecida Guerra Fria. O AI-5 surge dentro desse contexto polarizado e de tentativa, por parte dos militares, de estabelecer uniformidade, o que significou excluir direitos políticos dos seus opositores.
Publicidade
O que foi o ato institucional nº 5
O ato Institucional n° 5 (AI-5), incrementado pelo governo de Artur Costa e Silva, em 13 de dezembro de 1968, é a maior expressão do autoritarismo exercido pela ditadura militar (1964 – 1985), construído gradativamente desde os anos 1964. Apesar de ter vigorado até o ano 1978 durante o governo e Ernesto Geisel, alguns historiadores costumam pensar o ano 1968 como “o ano que não acabou”, tendo em vista o impacto que esse momento teve na história brasileira, tanto por reprimir a expressão política dos grupos opositores ao regime ditatorial como por cercear a própria liberdade através da modificação dos hábitos, ideias e costumes da sociedade de então.
Relacionadas
O golpe militar não criou de imediato um regime com poderes absolutos e vale lembrar que após a deposição do presidente João Goulart, em 2 de abril de 1964, o poder governamental foi exercido, na prática, por uma Junta Militar, autodenominada Comando Supremo da Revolução. A junta militar foi composta por uma série de governos militares que tiveram o objetivo de estabelecer o controle social diante da ameaça e do “terror” dos setores da oposição, apesar das particularidades de cada um dos grupos.
Para isso, o regime se serviu dos atos institucionais, instrumentos jurídicos autoritários e não baseados na constituição. Senso assim, os atos institucionais inauguram uma ordem política e jurídica que anularam o funcionamento das instituições democráticas no país firmando ainda mais um modo de governo autoritário.
Antecedente histórico de um ato autoritário
Após a tomada de posse da presidência pelo general Artur da Costa e Silva, em 15 de março de 1967, e o enfraquecimento de alguns grupos oposicionistas ao regime, como o MDB e a Frente Ampla, o principal grupo que concentrou as insatisfações e descontentamentos, realizando reivindicações frequentes, foi o Movimento Estudantil movido por ideais políticos totalmente contrários aos do Regime.
Para levantar um protesto reativo, os grupos sociais se mobilizaram na Passeata dos Cem mil, em junho de 1968, no centro do Rio de Janeiro. Vale mencionar que o grande ato público realizado contra a ditadura militar foi movido também pela morte do estudante Edson Luis de Lima Souto, morto por forças policiais em um ato público de oposição aos ideais ditatoriais.
Publicidade
Diante da força que ganhava o movimento estudantil, o regime passa a proibir a liberdade de expressão e de manifestação política, intervindo também nas universidades públicas, sendo este um dos centros mais frequentados pelos estudantes. Todo esse momento de proibição autoritária reflete, na visão da cientista política Maria Celina D’Araujo, um governo que “precisava ser mais enérgico no combate a ‘ideias subversivas’”.
Perceba o quanto esse momento é marcado por um conflito, não só de interesses em relação ao Brasil, mas de ideologias que vigoravam nesse período.
Estopim do AI-5
Um fator que movimentou ainda mais as insatisfações dos grupos opositores à ditadura foi a prisão de 700 estudantes em outubro de 1968, quanto estes participavam de um congresso na União Nacional dos Estudantes (UNE). Com tamanho aumento da repressão, muitos estudantes e oposicionistas de outros grupos sociais recorreram à luta armada. Lentamente, alguns grupos políticos de esquerda formaram organizações armadas de modo a combater mais duramente a repressão do regime, como a Ação Libertadora Nacional (ALN), a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), dentre outras.
Publicidade
O AI-5 surge como resposta a essas manifestações oposicionistas, com o discurso de “[…] atender às exigências de um sistema jurídico e político” que em sua totalidade “assegurasse autêntica ordem democrática, baseada na liberdade, no respeito à dignidade da pessoa humana, no combate à subversão e às ideologias contrárias às tradições de nosso povo”.
O estopim para a implementação do AI-5 esteve em um discurso convidativo realizado pelo deputado e jornalista Márcio Moreira Alves, do MDB, em setembro de 1968. Nele, o deputado teceu diversas críticas às ações realizadas pelos militares e convidou a população a um “boicote ao militarismo“, afinal, ainda segundo o deputado, “discordar em silêncio pouco adianta”. Poucos meses depois, o AI-5 havia sido decretado; já em seguida, 11 deputados federais foram cassados, dentre eles o deputado Márcio Moreira Alves e Hermano Alves.
Os números aumentaram diante da maior expressão de autoritarismo da ditadura militar, não só em cassação, mas em fortes perseguições, prisões, torturas e mortes de opositores, dentre eles ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), estudantes, operários, membros da ala progressista da Igreja, artistas e intelectuais, dentre outros. Em suma, um decreto marcado pela intolerância.
O AI-5 é mais que uma resposta a oposição de esquerda
Nas palavras do historiador Rodrigo Patto Sá Motta, O “AI-5 foi uma forma de enquadrar os dissidentes dentro das próprias hostes da ditadura”, ou seja, apesar dos documentos oficiais produzidos pelo próprio regime enquadrarem a “esquerda e o comunismo” como motivação para o AI-5, essa justifica é frágil, pois no Brasil esses grupos não tinham força suficiente para derrubar o regime, mesmo os grupos armados, visto que estes não tinham apoio popular.
A principal motivação para o decreto do Ato institucional n° 5, afirma Motta, foram os grupos da sociedade civil (Imprensa, Igreja católica, poder judiciário e líderes políticos) que havia apoiado o golpe de 1964 inicialmente e que, alguns anos depois, começou a ficar insatisfeito com os rumos que o regime havia tomado.
Diante desse fato, o governo criou formas de disciplinar de maneira autoritária aqueles que o apoiaram, e eram muitos grupos civis envolvidos e atividades de influência. Lentamente a ditadura civil-militar foi perdendo o apoio “civil”, e o caso Moreira Alves foi apenas uma “desculpa” para colocar em prática um ato que já vinha sendo gerado e arquitetado lentamente, declarou anos depois o ex-ministro da Fazenda do Regime, Antônio Delfim Netto.
Características do AI-5
Geralmente, podemos elencar as principais características desse decreto que, de forma autoritária, reprimiu um dos grandes pilares de toda e qualquer sociedade democrática: a liberdade e pensamento plural.
- poderes absolutos ao presidente para fechar o Congresso, Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais e (Art. 2°)
- Suspensão das garantias do poder Judiciário e Cassação dos mandatos de parlamentares (Art. 3° e Art. 4°);
- Suspensão por dez anos dos direitos políticos de qualquer indivíduo e liberdade vigiada (Art. 4°);
- Demissão de funcionários públicos (Art. 6°);
- Decreto do estado de sítio por tempo indeterminado (Art. 7°);
- Confiscação dos bens privados (Art. 8°);
- suspensão de habeas corpus nos casos de crime contra a segurança nacional (Art. 10°).
Todas as características mencionadas retratam alguns indicadores do porque o Ato institucional n° 5 foi o mais violento de todo o período.
Por que o AI-5 foi o mais violento?
Conhecido como “anos de chumbo” ou como “o ano que não terminou”, o AI-5 é considerado o ato institucional mais violento de toda a ditadura militar, não só por cercear a liberdade dos setores contrários à ditadura, mas por incrementar ações visando censurar e silenciar muitas pessoas.
As manifestações políticas foram proibidas, mandatos parlamentares cassados, intelectuais e artistas perseguidos, e até mesmo alguns cidadãos perderam os seus direitos políticos; somado a isso, os meios de comunicação foram censurados e alguns políticos, e representantes influentes foram presos ou mortos.
Por fim, o pensamento plural, base de uma sociedade democrática, foi totalmente extinto.
Consequências do AI-5
A principal consequência do AI-5 foi a mobilização e o uso das forças armadas para a defesa do regime que vigorava e que começava a perder apoio dos principais setores da sociedade.
Conhecido por ser o ato “mais sombrio” da ditadura, principalmente por censurar os meios de comunicação e expressão, o AI-5 cassou os direitos e mandatos políticos daqueles que levantavam até mesmo críticas contra o regime, como Juscelino Kubitschek e Carlos Lacerda, que haviam apoiado o golpe inicialmente.
Até então percebemos que em meio a tantos nomes, sujeitos, e acontecimentos, o que levou os militares a instituírem o autoritarismo por meio do AI-5 foi uma visão ideológica movida por uma narrativa política do que seria melhor para o país, como também quais sujeitos se enquadrariam como “inimigos” do Brasil.
A instauração do terror, muito bem trabalhado pela filósofa e cientista política, Hanna Arendt, ajuda a compreender que toda narrativa deve ser vista com cautela, afinal toda narrativa é política e carrega consigo interesses, visões de mundo e intenções. O golpe militar é, sobretudo, fruto de um conflito de narrativa, que criou, por exemplo, o mito da “ameaça comunista”, ainda existente no tempo presente.
Vídeos sobre O AI-5
Como forma de se aprofundar um pouco mais na temática, veja alguns vídeos que detalham os aspectos estudados até aqui. Assista-os e complemente o seu aprendizado!
AI-5 através das imagens
Neste vídeo, você confere um pequeno documentário feito pela TV Câmara sobre os antecedentes do AI-5, com imagens e vídeos do próprio período.
Discurso que levou ao decreto do AI-5
Como analisado até aqui, o discurso do deputado e jornalista Márcio Moreira Alves foi considerado o estopim para o decreto do Ato institucional n° 5, e no vídeo você poderá conferir o discurso de forma viva!
O AI-5 visto nos dias de hoje
No vídeo, a historiadora e antropóloga Lilia Schwarcz analisa de forma detalhada o contexto histórico e características do momento de implementação do AI-5.
Analisar o processo histórico da ditadura civil-militar por meio do Ato institucional n° 5 é um exercício de lembrar aquilo que a sociedade esteja querendo esquecer. Afinal, a memória dos brasileiros parece ser curta… Se você quer continuar crescendo em aprendizagem histórica, conheça um pouco mais do Liberalismo econômico
Referências
A ditadura envergonhada (2014) — Elio Gaspari
Em guarda contra o perigo vermelho (2002) — Rodrigo Patto Sá Mota
As origens do totalitarismo (2013) — Hanna Arendt
AI-5: O mais duro golpe do regime militar (CPDOC) — Maria Celina D’Araujo
Por Thiago Abercio
Historiador e mentor educacional formado pela Universidade Federal de Pernambuco. Professor de História e de Repertório cultural e Ideias, redator e analista de conteúdo. Atualmente realiza pesquisas na área de História da arte e das mentalidades.
Abercio, Thiago. Ato Institucional nº5 (AI-5). Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/historia/ai-5. Acesso em: 03 de December de 2024.
1. [UFRJ]
“(…) Considerando que, assim, se torna imperiosa a adoção de medidas que impeçam sejam frustrados os ideais superiores da Revolução, preservando a ordem, a segurança, a tranquilidade e o desenvolvimento econômico e cultural e a harmonia política e social do país (…).”
(Ato Institucional nº 5 – 13/12/1968.)
A edição do AI-5 representou, há 30 anos, uma radicalização do poder gerado pelo golpe político-militar de abril de 1964 no Brasil. Diante do quadro que se apresentava na época, podemos entender que “os ideais superiores da Revolução” significavam:
A) a integração do capitalismo brasileiro ao grande capital internacional e a representação da segurança nacional por um anticomunismo radical.
B) a implantação da chamada “República Sindicalista” e a vinculação econômica ao sistema financeiro internacional.
C) o desenvolvimento capitalista independente e a aproximação político-cultural com os países latino-americanos.
D) a maior aproximação com o capitalismo europeu para romper a dependência com os Estados Unidos e a União Soviética.
E) a criação de uma economia planificada e uma aproximação com outros regimes revolucionários da América.
A) a integração do capitalismo brasileiro ao grande capital internacional e a representação da segurança nacional por um anticomunismo radical.
O AI 5 teve como principal objetivo a tentativa de alinhar a realidade econômica brasileira com o capitalismo internacional, fortalecendo, portanto, a segurança nacional de modo a manter a ordem contra a “subversão” dos seus opositores
2. [UFES]
(Ufes) “CENSURA AO ‘PARALAMAS’ TRAZ TESOURA DE VOLTA
Extinta oficialmente em 1985, a censura treina novos cortes nos tempos de abertura: o grupo Paralamas do Sucesso foi proibido de cantar a música ‘Luís Inácio’ num show em Brasília”. (O GLOBO, 19-07-95)
O conteúdo da notícia, embora em situação e contexto diferentes, faz-nos lembrar a época em que a censura foi aplicada com intensidade na ditadura militar, especialmente após 1968, quando a repressão se tornou mais rigorosa com o AI-5, imposto num ambiente marcado por vários fatores, dentre eles o:
A) fim oficial do FGTS, o que irritou os trabalhadores pela perda dos valores depositados.
B) enfraquecimento da base política do governo no Congresso, com a recusa dos parlamentares em permitir a perda da imunidade de um deputado para processo judicial.
C) apoio do chamado Tropicalismo, manifestação cultural de defesa da ditadura, principalmente por meio da música.
D) movimento de revolta de Jacareacanga, no Pará, que contestava o regime, conseguindo, entre os militares, cada vez maior número de adeptos.
E) apoio garantido pela compra pelo Brasil de um porta-aviões para ser incorporado à Marinha como suporte aeronaval às medidas repressoras do governo.
B) enfraquecimento da base política do governo no Congresso, com a recusa dos parlamentares em permitir a perda da imunidade de um deputado para processo judicial.
O ato institucional n° 5 concentra nas mãos do executivo o poder político de forma absoluta, sendo, portanto, uma resposta aos setores aos líderes políticos que passaram a se colocar enquanto posição às ações arbitrárias e autoritárias da ditadura militar.