Voltaire é, sem dúvidas, um dos principais símbolos do Iluminismo, importante movimento filosófico do Século XVIII. Contra fanatismos, dogmas, religiões e metafísica, o filósofo se dispõe de muito sarcasmo e ironia em defesa de conceitos acerca da liberdade, justiça e tolerância. Assim como, para ele, a história é progressiva e evolui à medida que os homens se esclarecem com a luz da razão.
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Biografia
François-Marie d’Arouet (1694-1778), mais conhecido como Voltaire, é natural de Paris. Ao longo de sua vida, escreveu diversos livros, contos, obras dramatúrgicas e cartas de manifesto político – graças a essas últimas -, recebeu a alcunha de “O Panfletário”.
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De família aristocrática, Voltaire foi educado em escolas de prestígio, como o colégio jesuíta Louis-le-Grand de Paris. Além disso, seu pai desejava lhe colocar em posição de autoridade pública, usando de sua influência para estabelecer seu filho dentre a nobreza: a princípio, como estudante de direito; depois como aprendiz de advocacia e, por fim, como assistente de um diplomata francês. Porém, a personalidade forte e ríspida de Voltaire fez com que os planos de seu pai fracassassem.
Assim, o jovem seguiu sua ambição literária sempre, contudo, em meio à nobreza e ao lado de monarcas. Entretanto, em meio a muitas obras publicadas e peças apresentadas, o escritor parisiense fez inimigos e se tornou persona non grata por muitos lugares pelos quais passou. Finalmente, após diversos exílios, retornou a Paris em 1778 para a apresentação de Irene, uma de suas peças teatrais. Todavia, faleceu em sua cidade-natal poucos meses após a chegada.
Principais ideias e teorias de Voltaire
Voltaire consolidou-se como defensor da liberdade e da tolerância. Além disso, ele acreditava que a razão humana deveria ser liberta dos preconceitos. Só assim, haveríamos um progresso histórico, sendo necessário para tal a consolidação do Iluminismo. A seguir, falamos mais sobre algumas das principais ideias que compõem seu trabalho.
Tolerância
Esmagar a infame! é a palavra de ordem do filósofo contra a Igreja e os adeptos do fanatismo. Com efeito, Voltaire era um grande crítico do clero e dos excessos praticados pela aristocracia religiosa e política em nome da religião. Acreditava, no entanto, que a religião poderia ser uma boa mantenedora da ordem social, visto que nem todas as pessoas seriam capazes de compreender sua própria razão e fazer uso sensato de seu livre-arbítrio. Contudo, é de suma importância o combate à intolerância, principalmente atribuída ao clero. À época, este possuía relações com as autoridades que agiam inescrupulosamente em nome da religião tomando, desse modo, atitudes com as quais Voltaire contestava veementemente, como condenações à tortura e à morte por supostos crimes de sacrilégio, quando as reais motivações de certos clérigos eram políticas.
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Liberdade
Todo ser humano possui razão e papel social. Consequentemente, a liberdade passa a ser uma motivação verdadeira àqueles que conseguem se compreender como seres racionais capazes de agir dentro da sociedade. Aliás, a noção de liberdade de Voltaire é muito próxima a uma moralidade hedonista, isto é, uma vida moral que se fundamenta no prazer. Neste sentido, além de suas próprias ações, muitos dos textos de Voltaire eram considerados libertinos e subversivos, principalmente seus poemas. De fato, o filósofo poderia ser considerado não apenas um bon vivant, mas um manifesto opositor da repressão, principalmente a advinda da tradição cristã e das morais religiosas restritivas, como o celibato.
Por fim, é importante ressaltar que, para o iluminista, não há autoridade que esteja imune à crítica da razão nem mesmo o clero. Ademais, com o passar dos anos, seu trabalho se torna mais crítico aos mistérios sagrados nos quais monarcas e a sociedade aristocrática fundamentam sua autoridade, sendo que, contra tal, ele defendia o ceticismo e a razão crítica, bem como a liberdade.
Obras de destaque
Voltaire possui uma extensa bibliografia, dentre tratados, cartas, manifestos, contos, romances e o famoso dicionário filosófico. Abaixo, destacamos sete de suas principais obras.
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- Cartas Filosóficas (1734): também conhecidas como Cartas Inglesas, elas foram escritas durante seu exílio na Inglaterra e expressam a admiração de Voltaire pela liberdade e tolerância do país.
- Zadig ou o destino (1748): é um famoso conto filosófico que narra as desventuras do personagem fictício Zadig, um filósofo babilônico, em alusão aos problemas sociais e políticos contemporâneos a Voltaire.
- Micrômegas (1752): este conto narra a jornada de um gigante pelo Sistema Solar e mostra o quão significante é o homem em relação ao Universo.
- Tratado sobre a tolerância (1763): este livro é um protesto contra a intolerância e o fanatismo religioso em decorrência da acusação considerada injusta e execução de Jean Calas como responsável pela morte de seu filho.
- Dicionário filosófico (1764): com verbetes organizados em ordem alfabética, Voltaire ridiculariza as crenças oficiais – civis e escolásticas – de sua época.
- O ingênuo (1767): é um romance filosófico que satiriza o conservadorismo religioso, monárquico, e da nobreza, enquanto narra a mudança de um sujeito das Américas para a Europa.
- O preço da justiça (1777): nesta obra, Voltaire medita acerca das origens e sentidos dos conceitos de justiça e injustiça, honestidade e desonestidade, bem e mal.
Voltaire foi um homem que escreveu sobre seu tempo e nos mostra como a humanidade ainda tem muito a evoluir, pois sua extensa obra que certamente vale a leitura, permanecendo atual.
6 curiosidades sobre Voltaire
Prisões, exílios e obras censuradas. Voltaire escreveu e viveu conforme seus próprios ideais. A seguir, listamos algumas dessas passagens marcantes de sua vida.
- Ficou encarcerado na Bastilha em duas ocasiões: em 1717, por uma sátira do duque de Orléans; e, em 1726, por brigar com um nobre. Em seguida, exilou-se na Inglaterra. Aliás, em seu currículo, também consta outro exílio em Genebra após desentender-se com o rei Frederico II da Prússia Em 1755.
- Em 1758, após desentendimentos em Genebra, mudou-se para Ferney, na fronteira da França com a Suíça. Devido à influência positiva do filósofo na comunidade, em 1878, a comuna passou a chamar Ferney-Voltaire.
- Certa vez, Voltaire escreveu a Rousseau “querer andar com quatro patas” ao ler sua obra Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens (1755). Era uma crítica à exaltação do conceito de “homem natural” do genebriano.
- Escreveu cerca de 50 peças teatrais, dentre elas, as reconhecidas tragédias: Oedipe (1718); Zaïre (1732); Mahomet (1741), a qual foi censurada em Paris; Mérope (1743); e Irene (1778).
- Em 1730, indignado com o fato de a Igreja ter recusado um sepultamento cristão à atriz Adrienne Lecouvreur, Voltaire publicou um poema criticando o clero por tratar uma artista como criminosa.
- Em 1766, o jovem cavaleiro de La Barre foi condenado à tortura e à morte por sacrilégio. Uma cópia do Dicionário filosófico de Voltaire teria sido queimada junto ao seu corpo. Voltaire julgou ter ocorrido grande injustiça e exagero por parte do clero e publicou um artigo criticando Luís XV por não interceder.
Certamente, Voltaire teve uma vida movimentada e repleta de reviravoltas. O autor sempre se posicionou publicamente a favor da justiça e da tolerância o que, como visto, lhe custou algumas confusões e inimizades ao longo do percurso.
Frases de Voltaire
Polêmico e irônico, o estilo de escrita de Voltaire é a sua marca registrada, por isso, selecionamos algumas de suas frases mais conhecidas e que melhor definem seus ideais.
- “Estamos todos imersos em fraquezas e erros; perdoemos uns aos outros nossas bobagens – esta é a primeira lei da natureza” (Dicionário filosófico, 1764).
- “O preconceito é uma opinião sem julgamento. Assim em toda terra inspiram-se às crianças todas as opiniões que se desejam antes que elas as possam julgar” (Dicionário filosófico, 1764).
- “A história, com efeito, não é mais do que o quadro dos crimes e das desgraças” (O ingênuo, 1767).
- “A leitura engrandece a alma, e um amigo esclarecido a consola” (O ingênuo, 1767).
- “Se Deus não existisse, então, seria preciso inventá-lo” (Epístola ao autor do livro Os três impostores, 1771).
Sentiu falta de alguma frase? Pois é! A famosa frase “Eu não concordo com uma palavra do que você diz, mas defenderei até a morte o direito de dizê-las” amplamente atribuída a Voltaire, nunca foi escrita por ele. Por isso, é muito importante tomar cuidado com citações fora de contexto atribuídas a autores sem a devida referência.
Vídeos para conhecer melhor
Ficou curioso para saber mais sobre o ilustre filósofo? Separamos alguns vídeos com mais detalhes sobre a vida e algumas das principais obras de Voltaire.
A vida de Voltaire
Neste divertido vídeo, aprendemos mais sobre a vida do iluminista, passando por sua infância, curiosidades diversas e seu legado para nossa sociedade. Detalhe: o vídeo está em inglês, mas é possível ativar as legendas em português.
Livro: Cândido ou o otimismo
Neste vídeo, a Tamy faz uma resenha completa do conto “Cândido” que dará vontade de ler (ou reler) o livro.
Livro: Tratado sobre a Tolerância
O Tratado sobre a Tolerância é um livro cujo tema permanece atual e necessário. Aqui, Mateus Salvadori apresenta a ideia geral da obra e das intenções do autor.
Livro: Micrômegas
Há quem diga que este é um dos primeiros textos de ficção científica a ser publicado. De fato, é uma divertida e profunda crítica social, sobre a qual Gisele Eberspächer conta sua experiência de leitura.
Isto posto, é inegável que Voltaire exerceu grande influência e foi muito importante para a luta contra o autoritarismo desenfreado e contestável da aristocracia na França. Além disso, seus escritos a favor da tolerância e da liberdade permanecem atuais e necessários. Aliás, não somente Voltaire, mas os pensadores do iluminismo. Em geral, deixaram-nos um legado, cujos preceitos ainda nos são fundamentais para refletir sobre a nossa sociedade.
Referências
ABRÃO, Bernadette Siqueira (org.). A História da Filosofia. São Paulo: Nova Cultural, 2004.
CHAUÍ, Marilena de Souza (org.). Voltaire. Coleção Os Pensadores. – 3ªed. – São Paulo: Nova Cultural, 1984.
SHANK, J.B. Voltaire. In: The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Fall 2015 Edition), Edward N. Zalta (ed.). Disponível em: https://plato.stanford.edu/archives/fall2015/entries/voltaire/. Acesso em: 1 de maio de 2020.
Por Thaís Bravin Carmello
Licenciada e mestra em Filosofia pela Universidade Estadual de Maringá.
Carmello, Thaís Bravin. Voltaire. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/filosofia/voltaire. Acesso em: 23 de November de 2024.
1. [UFF]
O escritor e filósofo francês Voltaire, que viveu no século XVIII, é considerado um dos grandes pensadores do Iluminismo ou Século das Luzes. Ele afirma o seguinte sobre a importância de manter acesa a chama da razão:
“Vejo que hoje, neste século que é a aurora da razão, ainda renascem algumas cabeças da hidra do fanatismo. Parece que seu veneno é menos mortífero e que suas goelas são menos devoradoras. Mas o monstro ainda subsiste e todo aquele que buscar a verdade arriscar-se-á a ser perseguido. Deve-se permanecer ocioso nas trevas? Ou deve-se acender um archote onde a inveja e a calúnia reacenderão suas tochas? No que me tange, acredito que a verdade não deve mais se esconder diante dos monstros e que não devemos abster-nos do alimento com medo de sermos envenenados”.
Identifique a opção que melhor expressa esse pensamento de Voltaire.
a) Aquele que se pauta pela razão e pela verdade não é um sábio, pois corre um risco desnecessário.
b) A razão é impotente diante do fanatismo, pois esse sempre se impõe sobre os seres humanos.
c) Aquele que se orienta pela razão e pela verdade deve munir-se da coragem para enfrentar o obscurantismo e o fanatismo.
d) O fanatismo e o obscurantismo são coisas do passado e por isso a razão não precisa mais estar alerta.
e) A razão envenena o espírito humano com o fanatismo.
Resposta: C.
Justificativa: Todas as alternativas, com exceção da C, reduzem a importância da razão, quando na verdade Voltaire a exalta com instrumento de enfrentamento contra o fanatismo e o obscurantismo.
2. [UFRGS]
As ideias reformistas de Voltaire e as ideias revolucionárias de Rousseau contestavam o tradicionalismo religioso e a desigualdade social em que se apoiava o Antigo Regime, no qual os principais beneficiados eram
a) monarquia, Igreja e nobreza.
b) Igreja, nobreza e burguesia.
c) monarquia, Igreja e campesinato.
d) burguesia, Igreja e monarquia.
e) campesinato, nobreza e burguesia.
Resposta: A.
Justificativa: As críticas de Voltaire em relação ao fanatismo, intolerância e repressão eram direcionadas à aristocracia (monarcas e nobres) e ao clero (Igreja) que eram os detentores do poder na época.
3. [UENP]
Voltaire foi um dos mais famosos pensadores do Iluminismo. Com base na filosofia de Voltaire e nas críticas que estabeleceu, assinale a alternativa correta.
a) Criticou a intolerância religiosa e a prepotência dos poderosos.
b) Criticou a monarquia que respeitava as liberdades individuais.
c) Criticou a possibilidade da liberdade de pensamento dos cidadãos.
d) Criticou a liberdade de expressão e a tolerância como virtude.
e) Criticou Diderot e o trabalho deste com a organização da Enciclopédia.
Resposta: A
Justificativa: As alternativas B, C e D se equivocam ao recusar a importância da liberdade para o iluminista. A afirmação da alternativa E não procede, pois Voltaire foi um dos colaboradores da Enciclopédia. Então, claramente, a alternativa A é a que melhor retrata sua filosofia.