Hannah Arendt foi uma filósofa alemã de origem judaica. Uma das pensadoras mais importantes do século XX. Trabalhou as temas dos regimes políticos, a noção de liberdade e cunhou o conceito da banalidade do mal. Entenda seu pensamento e conheça suas principais obras.
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Biografia
Hannah Arendt nasceu em Linden, na Alemanha, em 14 de outubro de 1906 e morreu em Nova York, em 4 de dezembro de 1975. Ela foi uma filósofa política de origem judaica e uma das pensadoras mais influentes do século XX. Devido à ascensão do nazismo e da perseguição das pessoas de origem judaica na Alemanha a partir de 1933, Hannah Arendt resolveu emigrar. Em 1937 ela perdeu sua nacionalidade e ficou apátrida até 1951, quando se tornou cidadã norte-americana.
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Ela e sua família voltaram para a cidade de Königsberg, na Prússia (atual Kaliningrado, na Rússia), quando ela tinha três anos. Seu pai, Paul Arendt, era engenheiro e membro do Partido Social Democrata Alemão, morreu em 1913 e quem cuidou de sua formação foi sua mãe Martha Cohn. Hannah Arendt teve uma educação excelente, porque a família tinha boa condição financeira, e mesmo após a morte de seu pai, ela continuou recebendo uma educação consideravelmente liberal, porque sua mãe também tinha tendências sociais-democratas.
Com 14 anos já tinha lido a “Crítica da Razão Pura” de Kant e, aos 17 anos liderou um boicote na escola contra um professor, porque ele tinha a insultado. Por isso, ela foi expulsa da escola e se mudou sozinha para Berlim, onde se preparou para entrar na universidade.
Em 1924, ela entrou na Universidade de Marburg, onde assistiu às aulas de filosofia de Martin Heidegger e de Nicolai Hartmann e de teologia, além disso, estudou grego. Durante a graduação, ela teve um caso com Heidegger, um relacionamento que foi duramente criticado, já que o filósofo apoiava o Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães, o partido nazista.
O relacionamento acabou em 1926 e Hannah Arendt se mudou para a Universidade Albert Ludwig, em Freiburg, sendo orientada por Edmund Husserl. Ela também estudou filosofia na Universidade de Heidelberg e se formou em 1928, sob a tutoria de Karl Jaspers.
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Em 1930, a filósofa casou-se com Gunther Stern, que também era professor de filosofia. Em 1933 eles foram obrigados a se refugiar na França, pela ascensão do nazismo. Hannah Arendt pertencia à Organização Sionista Alemã, fato que a fez ser presa e interrogada diversas vezes antes de finalmente conseguir fugir para Paris.
No ano de 1939, Arendt e Stern se separaram e, no ano seguinte, ela se casou com o historiador anarquista Heinrich Bluecher. Devido à ocupação nazista na França, Arendt resolveu fugir, mas foi presa em um campo de concentração por alguns meses. Depois disso ela resolveu sair definitivamente do continente europeu e se mudou para os Estados Unidos.
Embora negasse o título de filósofa e negasse a designação de filosofia política para seus trabalhos, preferindo o termo “teoria política”, Hannah Arendt ainda é considerada filósofa por tecer argumentos substanciais às grandes discussões filosóficas, sobretudo nas filosofias de Sócrates, Platão, Aristóteles, Immanuel Kant, Martin Heidegger e Karl Jaspers.
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Em 2013, estreou o filme da diretora e roteirista Margarethe von Trotta “Hannah Arendt: ideias que chocaram o mundo”. A película mostra, principalmente, o momento em que a pensadora assiste ao julgamento do nazista Adolf Eichmann, que renderá o livro “Eichman em Jerusalém”.
Principais ideias de Hannah Arendt
Hannah Arendt era adepta do conceito de “pluralismo” no âmbito político. Pelo pluralismo seria possível gerar o potencial de uma liberdade e igualdade política entre as pessoas. Ela trabalhou acerca da questão da importância do pensamento crítico como guia das ações humanas. Mas, sem dúvidas, suas principais ideias dizem respeito ao totalitarismo e à noção de mal.
- Banalidade do mal: talvez o conceito mais importante de sua teoria. Depois de assistir ao julgamento de Eichmann, em 1961, Hannah Arendt cunhou o conceito da banalidade do mal. Para a teórica política, o mal não deve ser encarado pela moral, mas sim pela política. O sujeito que pratica o mal porque sucumbiu às falhas de pensamento e de juízo. Para Arendt, os sistemas políticos opressivos tiram vantagem do fato de o homem ser suscetível a falhas e fazem com que atos, a princípio, impensáveis pareçam normais. O mal, portanto, não é um monstro que se instala, mas sim algo que pode acontecer a qualquer momento por um erro de julgamento.
- Liberdade: Arendt defendia a existência de um Estado que defenda as liberdades individuais, de forma que os direitos humanos e a cidadania não sejam confrontados. A liberdade, portanto, é um direito inalienável do homem e é o sentido da política.
- Ideologia: de acordo com Hannah Arendt, ideologia é o instrumento usado para criar um sistema de explicações. A ideologia possui três elementos básicos. O primeiro é próprio de movimentos totalitários, pois explica a História de um jeito total e sem perspectiva de mudança. O segundo é o caráter de propaganda e doutrinação da ideologia. O terceiro elemento é como a filosofia distancia as pessoas das experiências reais da vida em detrimento da primazia da razão.
- Autoridade: Arendt aborda a questão da autoridade a partir das instituições, da cultura e das tradições políticas do Ocidente. Segundo ela, não é possível existir autoridade se o Estado utiliza a força e a violência para conter ou controlar o povo. Um exemplo disso é quando os policiais reprimem manifestantes em protestos. A autoridade na política é, para a filósofa, a confiança do povo em seu sistema político.
- Solidão e isolamento: sobre isso, no livro “As origens do totalitarismo”, Arendt diz: “Posso estar isolado – numa situação em que não posso agir porque não há ninguém para agir comigo – sem estar solitário; e posso estar solitário – numa situação em que me sinto completamente abandonado da companhia humana- sem estar isolado”. Ou seja, o isolamento é uma impotência, a solidão é a noção de vida privada.
Essas são as principais ideias de Hannah Arendt. No entanto, ela também teceu críticas ao marxismo e ao conceito de trabalho em Marx, além de estudar outras formas de governo e criticar a democracia representativa.
Principais obras de Hannah Arendt
As principais obras de Hannah Arendt são “As Origens do Totalitarismo”, “A Condição Humana”, “Eichmann em Jerusalém”, além de escrever outros livros e diversos artigos. Veja sobre alguns de seus livros.
As Origens do Totalitarismo
O livro foi publicado em 1951 e nele, Hannah Arendt procura compreender o fenômeno totalitário do século XX. Ela parte dos estudos políticos de Montesquieu sobre o poder e as formas de governo para poder introduzir uma nova forma: o totalitarismo. Arendt retoma os elementos básicos de cada governo, a honra para manter a monarquia, o orgulho para a república e o exercício de provocar o medo para a tirania.
Para Arendt, no entanto, o totalitarismo não se limita ao medo, ao orgulho e à honra; o totalitarismo opera pelo terror. Além disso, a filósofa aponta como o papel da aceitação popular era fundamental para a manutenção desses regimes. O modus operandi do totalitarismo é promover uma ideia de que existe um inimigo na nação que precisa ser detido a todo e qualquer custo, caso contrário, a nação acabaria.
A condição humana
Publicado em 1958, esse livro retoma a discussão do totalitarismo em algumas partes. É um livro existencialista, na medida em que analisa o que é o ser humano, mas não perde sua noção política porque faz a análise a partir da perspectiva de labor, trabalho e ação. “A Condição Humana” faz uma análise do que é ser humano a partir da perspectiva da ação e do trabalho. É nesse livro que entram as críticas a Marx.
O labor é responsável por suprir as necessidades biológicas do indivíduo e da espécie. O trabalho é o momento em que o homem se afasta da natureza e constrói seu próprio mundo. Já a ação é um fim em si mesma e não depende de um meio. A ação mostra a capacidade do homem de criar.
Eichmann em Jerusalém
Em 1963, após assistir ao julgamento de Eichmann em 1961, Hannah Arendt publica “Eichamann em Jerusalém”. Nesse livro é exposto o conceito da banalidade do mal. Segundo ela, o militar nazista não parecia um monstro, quando visto pelo público e, caso fosse visto em uma cafeteria, ninguém imaginaria as atrocidades que ele cometeu. O termo banalidade está ligado à figura da pessoa que pratica o mal. Quando ela olhou para Eichmann, ele não parecia um monstro mitológico, mas sim um homem normal, por isso o termo banal, por estar relacionado ao cotidiano.
Nesse livro, Arendt defende que o mal não é natural do homem e que não pode ser encarado pela moral, mas sim pela política. O mal acontece porque as pessoas cometem falhas de pensamento e de juízo e estão mais propícias a cometerem essas falhas quando vivem em um sistema político opressivo que normaliza a violência e o terror. Apresenta também que mal radical é aquele que se fundamente no ódio.
Outras obras de Hannah Arendt
- Entre o Passado e o Futuro (1961);
- Sobre a Revolução (1963);
- Sobre a violência (1970).
Esse foi um breve resumo das principais obras de Hannah Arendt. É importante lembrar que as questões do totalitarismo, da liberdade e do mal acabam perpassando diversas obras. Muito de sua biografia influenciou na sua produção acadêmica, sobretudo quando se olha para os trabalhos cujo tema principal é o nazismo.
7 frases de Hannah Arendt
Nestas sete frases, é possível sintetizar alguns dos pensamentos de Hanna Arendt.
- “A essência dos Direitos Humanos é o direito a ter direitos”.
- “Poder e violência são opostos; onde um domina absolutamente, o outro está ausente”.
- “O poder nunca é propriedade de um indivíduo; pertence a um grupo e existe somente enquanto o grupo se conserva unido”.
- “Em nome de interesses pessoais, muitos abdicam do pensamento crítico, engolem abusos e sorriem para quem desprezam. Abdicar de pensar também é crime”.
- “Uma vida sem pensamento é totalmente possível, mas ela fracassa em fazer desabrochar sua própria essência – ela não é apenas sem sentido; ela não é totalmente viva. Homens que não pensam são como sonâmbulos”.
- “Vivemos tempos sombrios, onde as piores pessoas perderam o medo e as melhores perderam a esperança”.
- “O objetivo da educação totalitária nunca foi incutir convicções, mas destruir a capacidade de formar alguma”.
Nessas frases, vê-se a ideia de preservação do espaço público como um tema de grande relevância no pensamento de Hanna Arendt, haja vista que o espaço público seria a única forma de assegurar as condições da prática da liberdade e da cidadania. Encontra-se também a discussão sobre como o fundamento do poder é a convivência e cooperação. De acordo com Arendt, a violência destrói o poder, porque se baseia na exclusão desses elementos basilares do poder. Por fim, é possível notar a importância do pensamento crítico.
Por dentro dos livros de Hannah Arendt
Nestes vídeos, você poderá entender melhor sobre os livros “As origens do totalitarismo”, “Eichmann em Jerusalém” e “A condição humana”.
Sobre as origens do totalitarismo
Nesse vídeo, o professor Mateus Salvadori fala sobre o livro “As origens do totalitarismo” de Hanna Arendt. Ele aborda três teses do livro: o totalitarismo como negação da política; o terror e a ideologia; os campos como experiência política.
A banalidade do mal
No vídeo do canal da Casa do Saber, o professor Paulo Niccoli aborda sobre o tema da banalidade do mal. Ele explica que a banalidade do mal ocorre quando a razão se torna banal. O professor explica como esse conceito se aplica nos campos de concentração.
Sobre a Condição humana
O vídeo do canal Doxa e Episteme fala sobre o livro “A condição humana”, ele explica os conceitos de ação, libertação mútua, e sobre a vingança e o ato de perdoar.
Nessa matéria foram apresentados os principais conceitos trabalhados por Hannah Arendt e também foram feitos pequenos resumos sobre suas obras. Gostou da matéria? Leia mais sobre sua abordagem teórica, o Existencialismo.
Referências
A condição humana (2007) – Hannah Arendt
As Origens do Totalitarismo (1998) – Hannah Arendt
Convite à Filosofia (2000) – Marilena Chauí
Eichmann em Jerusalém (1999) – Hannah Arendt
Filosofando: introdução à filosofia. (2009) – Maria Lúcia Aranha e Maria Helena Martins.
O livro da filosofia (2011) – Will Buckingham et. al
Por Marilia Duka
Graduada em Filosofia pela Universidade Estadual de Maringá em 2016. Graduada em Letras Português/Francês na Universidade Estadual de Maringá em 2022.
Duka, Marilia. Hannah Arendt. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/filosofia/hannah-arendt. Acesso em: 21 de November de 2024.
1. [ CEPERJ 2013]
Durante o século XX, a filósofa Hannah Arendt afirmou que existe uma antiga resposta para a pergunta sobre o sentido da política tão simples e concludente, que poderia dispensar outras respostas por completo. De acordo com o que explana Hannah Arendt em “O que é política?”, esse sentido da política é:
a) o poder
b) a liberdade
c) a igualdade
d) a administração
e) o bem
Alternativa correta é a B.
Para Hanna Arendt a política tem por objetivo a garantia da liberdade.
2. [UFMG 2012]
LEIA, abaixo, o comentário que a filósofa Hannah Arendt fez sobre as ações do comandante do Reich, Adolf Karl Eichmann, acusado de crimes contra o povo judeu:
“Os feitos eram monstruosos, mas o executante (…) era ordinário, comum, e nem demoníaco nem monstruoso.”
Hannah Arendt, A vida do espírito.In: Eduardo Jardim de Moraes e Newton Bignotto, Hannah Arendt: diálogos, reflexões e memórias. Belo Horizonte: Editora UFMG, p.138.
Assinale a alternativa em que o fator cultural presente nas ações comentadas explica CORRETAMENTE o fenômeno histórico acima mencionado:
A) A execução de atos criminosos com requintes de crueldade, ordenada pelas autoridades, foi praticada por pessoas comuns, afetadas principalmente pela falta de alimento e de emprego.
B) A banalidade na execução de crimes contra a humanidade se deve à burocratização do genocídio, implementada pela cúpula nazista, para liberar as pessoas de preocupações com a moral comum e com as leis.
C) A participação da juventude hitlerista no processo de construção do nacionalismo reforçou o senso político de oposição aos regimes socialistas autoritários.
D) A experiência nazista é um exemplo de fortalecimento da sociedade pelo Estado, criador de símbolos e valores culturais, que reforçam os princípios autoritários de governo.
A alternativa correta é a B.
Uma das principais características de sistemas opressores é o convencimentos de que ações impensáveis, violentas e desumanas são comuns.