Georg Wilhelm Friedrich Hegel é um clássico antigo na Filosofia. Ele é reconhecido, por exemplo, pela sua influência no pensamento político moderno.
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Uma das primeiras associações mais imediatas que as pessoas fazem em relação a Hegel talvez seja em relação a Marx. Isso porque é dito que o pensamento marxista virou Hegel de “cabeça pra baixo”. O que isso significa? Veremos a seguir algumas das ideias principais do autor.
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Biografia de Hegel
O filósofo Georg Wilhelm Friedrich Hegel, ou simplesmente Friedrich Hegel, nasceu em Stuttgart, na Alemanha, em 27 de agosto de 1770. Com 18 anos, Hegel já iniciava seus estudos em teologia e filosofia, iniciando sua carreira acadêmica.
Inicialmente, Hegel estudava para ser um pastor, pois veio de uma família protestante. Entretanto, viu que não possuía vocação para isso. Em 1779, com o falecimento do seu pai, herdou um patrimônio que lhe permitiu estudar em tempo integral.
Em 1801, Hegel conseguiu iniciar sua carreira como professor, tornando-se posteriormente também redator de jornal e reitor de uma escola de latim. Casou-se em 1811 com Marie von Tucher e teve dois filhos com ela. Em 1818, o filósofo lecionava na Universidade de Berlim, quando, em 1831, acabou falecendo por conta de uma epidemia de cólera.
Foi também em 1807, em uma fase ainda juvenil de Hegel, que ele publicou uma de suas obras mais conhecidas, a “Fenomenologia do Espírito”. Nesta obra, Hegel critica alguns pensamentos de Kant e inaugura o idealismo absoluto, tornando-se reconhecidamente um intelectual independente e original.
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Nessa obra, Hegel teoriza sobre a história do espírito humano, analisando os pensamentos gerados pela humanidade até o momento. Com isso, ele organizou um desenvolvimento crescente e progressivo da razão.
A filosofia hegeliana ofereceu ainda elementos para pensar a ação política. Um ponto interessante nesse contexto é que, após a morte de Hegel, surgiram duas linhas de interpretação de sua obra: de um lado, os discípulos de uma “direita hegeliana” e, de outro, uma “esquerda hegeliana”.
Esse e outros aspectos da teoria de Hegel revelam como sua obra se disseminou e influenciou a filosofia de sua época. Essa importância é reconhecida ainda atualmente. Algumas de suas ideias são explicadas a seguir.
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Pensamento de Hegel
Os filósofos anteriores a Hegel, como Kant ou Descartes, postulavam comumente que havia uma essência eterna das coisas que fundamentam o conhecimento humano. Hegel contraria essa ideia fazendo uma história do progresso da razão na humanidade. Ou seja, as verdades não são atemporais e elas caminham conforme uma lógica de crescimento.
Portanto, a razão humana acompanha o desenvolvimento da humanidade. Sua filosofia sobre as ideias são, assim, centrais na teoria de Hegel. Há vários aspectos de seu pensamento a serem considerados a partir dessa questão.
Idealismo
O idealismo é uma maneira de explicar que as coisas reais que existem são determinadas por uma ideia universal anterior. Hegel é reconhecido enquanto um idealista, mas não foi ele o primeiro e nem o único a tentar explicar que as ideias são anteriores às coisas, como fez Platão.
Por exemplo, para que seja construída uma casa, é necessário que exista antes uma ideia do que é uma casa. Essa ideia não foi um indivíduo ou outro que decidiu o que seria. Tratam-se, na verdade, de uma ideia universal que se estende a todos os indivíduos.
Entretanto, o idealismo de Hegel vai além, e é mais restritivo. Para Hegel, os conhecimentos úteis para explicar o mundo são aqueles verdadeiramente universais, baseados em ideias universais, como: qualidade, quantidade, existência, ser. Essas ideias tendem a se tornar cada vez mais universais à medida que a razão humana progride na história.
Estado
Ao invés de estudar Estados concretos em suas particularidades, Hegel tenta analisar o que é o Estado, ou seja, a sua ideia universal. Sendo uma ideia, ela se desenvolve progressivamente ao longo da história, e o Estado é o resultado desse crescimento da razão humana.
O Estado, para Hegel, é a síntese das vontades singulares e imediatas dos indivíduos. Ele é o resultado do desenvolvimento de instâncias como a ideia da família. Portanto, é no Estado que os indivíduos podem encontrar os seus deveres e também uma unidade dos desejos individuais.
Paradoxalmente ou não, é somente no Estado que a liberdade dos indivíduos também é contemplada. Isso porque, para os filósofos da época, a “liberdade” era uma questão central, e ela não poderia ser guiada simplesmente pelos desejos carnais e imediatistas do sujeito. A liberdade só ocorreria por meio da razão, ou seja, agindo racionalmente perante o mundo.
Por isso, o Estado é uma grande síntese de uma ideia universal que reúne as vontades individuais e permite a liberdade. Isso está no curso do desenvolvimento crescente da razão humana.
Racional e real
Para Hegel, não existe algo que seja impossível de ser pensado. Assim, ele afirma que “o real é racional e o racional é real”. Não é possível separar o mundo do sujeito, o objeto e o conhecimento, o universal e o particular.
Em outras traduções do alemão, é dito que “o real é efetivo”. Em outras palavras, não há nenhum conhecimento sobre o mundo natural ou espiritual que não seja alcançável pela razão. A razão não é, portanto, um conhecimento das contingências, das particularidades ou da subjetividade, mas é o meio pelo qual é possível compreender a essência das coisas.
O real efetivo, para Hegel, está na unidade entre a essência e a existência, entre o interior e exterior, em uma relação dialética. Essa dialética é a própria forma como as ideias se desenvolvem, e é central na filosofia do autor.
Dialética
Para Hegel, toda a realidade poderia ser compreendida por meio da dialética, alcançando a verdade mais universal por meio dela. A dialética mostra como as ideias contraditórias dependem uma da outra e estão em constante atrito.
A dialética do senhor e do escravo é um bom exemplo, dado pelo próprio Hegel. Nessa metáfora, primeiro, o Senhor, que é uma consciência, submete o Escravo a um objeto. Entretanto, para que o Senhor continue um senhor, o Escravo precisa reconhecê-lo como tal. Assim, o Escravo é ao mesmo tempo objeto e também sujeito: o Senhor precisa do Escravo para ser Senhor.
Quando o Senhor precisa do reconhecimento do Escravo, ele acaba se fazendo também objeto. Assim, as posições de Senhor e Escravo, sujeito e objeto, são trocadas a todo momento, como em uma luta incessante.
Assim, a dialética é fundamentada na tese e na antítese. Na metáfora do Senhor e do Escravo, a afirmação de um eu (tese) precisa do reconhecimento do outro, de sua própria negação (antítese). Esse atrito entre a tese e a antítese culmina na síntese, a negação da negação, no desenvolvimento da história.
A dialética é, assim, a própria forma como as coisas ocorrem, e é também o meio pelo qual podemos alcançar a verdade. O desenvolvimento da história está na superação das contradições.
Desse modo, é possível notar como a dialética está nas demais teorias do autor, como na ideia do Estado. Essas ideias foram fundamentais para o desenvolvimento da filosofia ocidental, tornando Hegel uma figura muito importante.
Principais obras de Hegel
Apesar de as obras de Hegel terem sido publicadas no século XIX, suas teorias são um clássico na filosofia até hoje. Listamos algumas das principais obras de Hegel para entrar em contato direto com o pensamento do autor.
- A diferença entre os sistemas filosóficos de Fichte e Schelling (1801)
- Introdução à história da filosofia (1805)
- Fenomenologia do Espírito (1807)
- Ciência da Lógica (1812)
- Enciclopédia das Ciências Filosóficas em esboço (1817)
- Linhas fundamentais da Filosofia do Direito (1821)
- Lições sobre a filosofia da história (1937; póstumo)
A filosofia de Hegel é importante não só para as pessoas interessadas em suas obras, mas também para quem deseja entender sobre a história da filosofia ou a influência de Hegel no pensamento de demais autores e autoras. Após sua morte, o filósofo continua ainda a impactar as ideias filosóficas.
Neo-hegelianismo
Após a morte de Hegel, seus discípulos não possuíam uma interpretação unânime das obras do autor. Na época, havia pelo menos duas vertentes em conflito: os “hegelianos de direita” e os “hegelianos de esquerda”, por sua vez conhecidos também como neo-hegelianos.
Os hegelianos de direita utilizavam as ideias de Hegel para afirmar sua posição política. Se o real é racional e o sistema é um resultado da síntese da dialética – e significa, consequentemente, um progresso humano –, a miséria e a monarquia da Alemanha eram justificáveis.
A filosofia de Hegel, nesse caso, oferecia um argumento para justificar o sistema que era dominante naquele momento. Os hegelianos de direita defendiam que a realidade em que se encontravam era, portanto, a mais racional possível naquele estado.
Em contrapartida, os neo-hegelianos, de esquerda, defendiam o caráter revolucionário no pensamento de Hegel. Ou seja, o movimento das ideias humanas nunca cessa e, pela dialética, deve haver uma antítese que leve o estado atual a um superior, uma síntese. Isso significava ir contra a monarquia alemã e não se conformar com a miséria que assolava a população.
O Estado prussiano era um dos alvos das críticas dos neo-hegelianos. Esses jovens foram expulsos de suas universidades por causa de seus posicionamentos; um deles em relação ao cristianismo, que era a religião oficial do governo. Os neo-hegelianos defendiam a unificação e a emancipação da nação alemã, que na época era dividida em diversas províncias.
Entre os neo-hegelianos mais famosos estão Ludwig Feuerbach e Karl Marx. Entretanto, há outros pouco difundidos e conhecidos, como David Friedrich Strauss, Max Stirner, Edgar Bauer e Bruno Bauer.
Hegel x Marx
Karl Marx pode ser considerado um dos neo-hegelianos, ou hegelianos de esquerda, que defendiam uma interpretação revolucionária da filosofia de Hegel. Entretanto, Marx também realizou uma “inversão” do autor. Assim, Marx possui semelhanças mas também diferenças em relação a Hegel.
É dito que Marx realiza uma “inversão” de Hegel porque, se Hegel era um idealista em termos filosóficos, Marx defendeu em sua teoria um materialismo. Ou seja, se para Hegel as ideias vêm antes das coisas, para Marx, as relações sociais (ou as “coisas”) é que precedem as ideias.
Para Marx, a história humana se desenvolve a partir da ação concreta dos seres humanos em sociedade. Essa ação é motivada por necessidades concretas; humanos precisam comer, beber, proteger-se, vestir-se. Essa base material é de onde vem o Estado, a religião, a arte e a política.
Por isso Marx é um materialista, ao contrário de Hegel, que afirma que as ideias é que precedem as coisas existentes. Por exemplo, em Hegel, o Estado é uma síntese que unifica e supre as contradições entre os desejos individuais, sendo o lugar onde a liberdade humana pode se realizar.
Não é essa, notadamente, a defesa de Marx. Para ele, o Estado atende aos desejos das classes dominantes, e nunca conciliou qualquer necessidade material dos grupos oprimidos. Se pela lei do Estado todos são iguais, o que a realidade material demonstra é o contrário: há desigualdade social que não é solucionada pelo Estado, mas apenas mantida por ele.
Nesse sentido, Marx se inspira na dialética de Hegel para propor os possíveis caminhos revolucionários. A contradição existente entre a classe dominante ou burguesa e a classe proletária deve fazer surgir uma nova síntese. O Estado e o capital fazem parte do sistema dominante, que a história humana exige que sejam superados.
Frases de Hegel
A filosofia de Hegel influenciou definitivamente o pensamento moderno. Não apenas Marx, como outros autores se inspiraram em suas ideias para construir suas próprias teorias.
A seguir, elencamos algumas frases de Hegel. Elas tornam mais explícitas as questões que preocupavam o autor, como o Estado, a consciência, o idealismo e o universal.
- “[A ideia do Estado] É a ideia universal como gênero e potência absoluta sobre os Estados individuais, o espírito que a si mesmo dá a sua realidade no progresso da história universal.”
- “Algo é em-si na medida em que, a partir do ser-para-outro, ele regressou a si.”
- “[…] o negativo é do mesmo modo positivo”
- “Segundo a minha perspectiva, que apenas se deve justificar através da exposição do sistema mesmo, tudo depende de apreender e exprimir o verdadeiro não como substância, mas igualmente como sujeito.”
- “as espécies não se diversificam do universal, mas somente umas perante as outras”
O caráter clássico de Hegel fez com que sua influência tenha sido disseminada não apenas para autores como Marx ou os neo-hegelianos, mas também para filosofias como em Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir. A metáfora da dialética do senhor do escravo, por exemplo, é interpretada e revisada de maneiras distintas com as que Hegel fez originalmente.
Desse modo, a filosofia hegeliana ainda pode suscitar dúvidas e novas ideias para pensar a sociedade em que vivemos e as relações entre as pessoas. Noções que usamos frequentemente hoje, como o Estado, tem uma influência decisiva de Hegel.
Referências
Para ler Hegel: aspectos introdutórios à fenomenologia do espírito e à teoria do reconhecimento – André Peixoto de Souza
A fenomenologia do espírito de Hegel e a unidade de sua filosofia: uma reavaliação sistemática – Lorenz B. Puntel
Para ler Hegel – João Nascimento Borges Filho
Hegel: vida, obra e sistema – UFMG
O jovem Marx e a realização da filosofia – Ricardo Rojas Fabres
A filosofia de Hegel – Fenomenologia – Ana Azevedo
Crítica de Marx à teoria hegeliana do Estado: uma leitura da obra crítica à filosofia do direito de Hegel – Eliúde de Oliveira Dutra
A filosofia hegeliana: sobre a necessidade de um debate na atualidade – Eduardo Ferreira Chagas; Manoel Jarbas Vasconcelos Carvalho; e Renato Almeida de Oliveira
Real e racional em Hegel. Para uma elucidação dos conceitos na fundação de uma ontologia dialéctica e idealista – Carolina Nogueira Martins
O conceito de Estado em Hegel – Alberto Ximenes Leitão Filho
Por Mateus Oka
Mestre em Antropologia Social pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Cientista social pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Realiza pesquisas na área da antropologia da ciência.
Oka, Mateus. Hegel. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/filosofia/hegel. Acesso em: 25 de November de 2024.
1. [UEM]
“Com Hegel, portanto, completa-se o movimento iniciado por Maquiavel, voltado para apreender o Estado tal como ele é, uma realidade histórica, inteiramente mundana, produzida pela ação dos homens. Nesse percurso foram definitivamente arquivadas as teorias da origem natural ou divina do poder político; afirmada a absoluta soberania e excelência do Estado; a especificidade da política diante da religião, da moral e de qualquer outra ideologia; reconhecida a modernidade e centralidade da questão da liberdade e, sobretudo – pois é esta a principal contribuição de Hegel –, resolvido o Estado num processo histórico, inteiramente imanente”. (BRANDÃO, G. M. “Hegel: o Estado como realização histórica da liberdade” in ARANHA, M. & MARTINS, M. Filosofando. São Paulo: Moderna, 2009, p. 316). A partir do texto citado, assinale o que for correto.
01) O Estado passa a ser entendido ao final da modernidade, ou seja, com Hegel, como uma instituição construída pelos homens, de origem eminentemente humana.
02) O Estado não nasce naturalmente, ele é inserido na vida humana como uma realidade a-histórica.
04) Para Hegel o Estado é uma entidade originada a partir de um mandato divino.
08) Para os pensadores políticos modernos – de Maquiavel até Hegel – a questão sobre a natureza do Estado implica a negação da liberdade humana.
16) A noção de Estado é fruto de uma elaboração teórica que se completa com Hegel, conferindo centralidade ao processo histórico na fundamentação deste conceito.
Resposta: 17
Justificativa: A filosofia de Hegel está baseada em um processo histórico e progressivo das ideias humanas e, portanto, não é a-histórica e nem de origem divina, mas humana. Para Hegel e outros autores que defendiam o caráter racional da liberdade humana, o Estado não implica a negação dessa liberdade. Com Hegel, a noção de Estado é aprofundada e utilizada por outros autores.
2. [IFRN]
“Este método é aplicado não só na lógica, mas também em todas as obras sistemáticas de Hegel. Em Fenomenologia do Espírito, por exemplo, procede de modo semelhante, passando da família à sociedade civil e desta para o Estado. Mas a dialética não é apenas uma característica de conceitos; é também de coisas e processos reais. Um ácido e um álcali, por exemplo, (1) estão inicialmente separados e são distintos; (2) dissolvem-se um no outro e perdem suas propriedades individuais quando são reunidos; e (3) resultam num sal neutro, com novas propriedades…”
O texto acima sobre a Dialética de Hegel indica que:
A) a dialética de Hegel, como a dialética de Platão, envolve sempre uma estrutura progressiva de diálogo entre dois ou mais pensadores, de modo a permitir que os sujeitos do conhecimento evoluam em direção às formas puras do pensamento.
B) a dialética em seus aspectos lógicos são suficientes para dar conta do método proposto por Hegel na fenomenologia do espírito.
C) a dialética hegeliana consiste em um método de verificação ontológica do valor de verdade de proposições que dizem respeito ao mundo, ao pensamento e ao próprio sujeito do conhecimento.
D) a dialética não é apenas um método, no sentido de um procedimento que um determinado pensador aplica a seu próprio objeto de conhecimento, mas, fundamentalmente, a estrutura e o desenvolvimento intrínsecos do próprio objeto.
Resposta: D
Justificativa: A dialética é a própria forma como ocorre o desenvolvimento dos fenômenos no mundo, incluindo a razão humana. Ela não se trata de um método dialógico ou de verificação da verdade, e nem esgota a filosofia hegeliana.